É comum o uso de materiais reforçados com fibras, como polipropileno (PP) ou poliamida (PA), para a produção de corpos ocos que precisam ser submetidos a pressões internas às vezes elevadas. Em tais componentes, a direção do fluxo do polímero fundido e, portanto, também a orientação principal das moléculas e fibras, é frequentemente predominantemente axial. Entretanto, como a tensão tangencial em tais corpos ocos é aproximadamente duas vezes maior que a axial, a Escola Superior de Osnabrück (Hochschule Osnabrück) desenvolveu um processo de moldagem por injeção com o qual o alinhamento axial das moléculas e fibras pode ser (parcialmente) convertido num alinhamento tangencial usando-se um núcleo rotativo (figura 1). As investigações iniciais sobre esta tecnologia já foram documentadas(1, 2), mas não houve progresso desde então. As pesquisas nas quais este trabalho se baseia retomaram esta tecnologia e, como será descrito a seguir, a desenvolveram com sucesso.


Fig. 1 – No caso de componentes plásticos submetidos à pressão interna e que apresentam elementos com simetria rotacional, a tensão tangencial é o dobro da axial (Fonte: (3))
 

Os objetivos deste estudo percorreram várias direções. No caso de aplicações existentes, pode ser possível adotar menores espessuras de parede, mas mantendo a mesma resistência mecânica, ou então conseguir níveis mais altos de resistência mecânica com a mesma espessura de parede. Isto reduz os custos, tanto na produção das peças plásticas (devido à economia de material e redução do tempo de ciclo) quanto em sua aplicação (por exemplo, pelo menor consumo de combustível).

Mas também novas aplicações, nas quais o plástico não tem sido utilizado até agora, podem ser cogitadas em decorrência dessa nova possibilidade. Aqui as possibilidades de aplicação são muito variadas. Por exemplo, corpos ocos alongados, feitos de materiais metálicos, para processamento de ar, como, por exemplo, compressores e carcaças de turboalimentadores, bem como em toda a área de condução (combustíveis, água). Nos últimos tempos a indústria automotiva vem utilizando motores cada vez menores, mas com potência cada vez maior. Estes motores estão sendo mais carregados, ou seja, há pressões mais elevadas em todas as áreas envolvendo o uso de ar.

O tema da construção leve também está se tornando cada vez mais importante em relação à economia de combustível. O plástico pode apresentar vantagens consideráveis sobre materiais metálicos em muitas áreas de aplicação devido à sua densidade muito menor. Além disso, componentes feitos com latão também deverão ser cada vez mais substituídos por plásticos em aplicações domésticas, devido ao seu preço e teor de chumbo. Atualmente, plásticos muito caros e com alta resistência têm de ser usados nesse caso. O novo processo também permitiria a adoção de menores espessuras de parede ou resinas com menor custo.


Fig. 2 – Um sistema de ferramental dotado de núcleo rotativo foi desenvolvido para um corpo de prova em forma de copo com o objetivo de defletir a orientação das moléculas e das fibras para a direção circunferencial (Fonte: Hochschule Osnabrück)

 

Desenvolvimento de um corpo de prova adequado

Na primeira etapa do projeto foi necessário encontrar uma geometria adequada que, por um lado, pudesse ser facilmente produzida, mas, por outro, não poderia estar muito distante da geometria real dos componentes. A aplicação típica se refere a componentes plásticos expostos à pressão interna. Estes frequentemente apresentam áreas com simetria rotacional, que são adequadas para movimentos de rotação relativa. A implementação mais simples de uma geometria para corpo de prova é um copo que pode ser preenchido na direção axial durante a moldagem através de um bocal para introdução de resina fundida em forma de guarda-chuva (figura 2). Em muitos casos esse preenchimento na direção axial também está presente em componentes reais.

O bocal em forma de guarda-chuva é absolutamente necessário para viabilizar a rotação do núcleo. No caso de componentes reais é frequente que o fundo do copo, projetado a partir do bocal em forma de guarda-chuva, não faça parte do sistema de alimentação, mas sim seja parte do componente propriamente dito. Dessa forma, esta geometria de copo é ideal para ilustrar um grande número de aplicações reais, para extrair corpos de prova simples para ensaios de tração em anel ou para testar o componente como um todo num ensaio de pressão de rompimento.


Fig. 3 – No final da fase de injeção (com enchimentorelativo das camadas limite “congeladas em conjunto”volumétrico) não é mais possível o movimento entre si (Fonte: Hochschule Osnabrück)

 

Núcleo do ferramental acionado por corrente

Foi desenvolvido um conceito de ferramental com núcleo rotativo para efetuar o movimento rotacional relativo entre superfícies opostas do molde durante o processo de moldagem por injeção. Esta concepção foi implementada como parte de um projeto de pesquisa da Escola Superior de Osnabrück (Hochschule Osnabrück) em cooperação com a firma H. Sundermeier GmbH, com sede em Hüllhorst, Alemanha.

O núcleo rotativo é montado no molde, sendo movido pelo acionamento de correntes. O núcleo passa através da placa de extração e a rotação é efetuada por um motor montado sobre o ferramental. Os ensaios de moldagem por injeção foram realizados em uma injetora Allrounder 270 C Golden Edition (fabricada pela Arburg GmbH + Co KG, de Lossburg, Alemanha). Neste modelo é possível integrar o controle do motor à execução do processo por meio de um sinal de 12 V. Desta forma, a movimentação do núcleo pode ser acionada nos momentos precisos dentro da sequência de operações.


Fig. 4 – Os corpos de prova em forma de anel foram usinados a partir de três posições nos componentes em forma de copo, sendo então determinada sua resistência à tração aparente utilizando-se um dispositivo de teste especial (à esquerda) (Fonte: Hochschule Osnabrück)

 

Os ensaios iniciais de moldagem por injeção utilizaram inicialmente um motor hidráulico em combinação com um conjunto hidráulico. Entretanto, devido às flutuações de pressão no conjunto hidráulico, não foi possível garantir velocidade de rotação constante do núcleo. Portanto, foi utilizado um motor elétrico para a confecção dos corpos de prova. Dessa forma foi possível definir e controlar claramente a velocidade de rotação por meio de um conversor de frequência. Isto, por sua vez, permitiu que o controle do processo se ajustasse com precisão aos parâmetros da moldagem por injeção (figura 2).

Este novo conceito de molde foi utilizado para a fabricação de peças em formato do copo usando-se diversos termoplásticos, contendo ou não cargas (tabela 1). Inicialmente variou-se a velocidade, uma vez que se tratava de um parâmetro cuja influência é essencial. Todos os outros parâmetros de moldagem por injeção foram definidos de acordo com as recomendações dos fabricantes da matéria-prima. Os parâmetros do processo foram coordenados de tal forma que a rotação do núcleo se correlacionasse com o tempo de injeção. Assim que o componente era preenchido volumetricamente, nenhum movimento relativo era mais possível entre as camadas externa e interna solidificadas do copo (figura 3).


Tab. 1 – Lista dos materiais estudados (Fonte: Hochschule Osnabrück).

 

Resultados dos ensaios mecânicos

Para determinar as propriedades mecânicas, inicialmente foram realizados ensaios de tração em anéis e, posteriormente, ensaios para determinação da pressão de ruptura. Para os ensaios de tração de anéis foram usinados corpos de prova anulares em três posições (distante do ponto de entrada de resina, central e perto do ponto de entrada de resina) dos componentes em forma de copo. A resistência à tração aparente foi determinada usando um dispositivo de ensaio conforme a norma técnica ASTM 2295 (figura 4).

Considerando-se inicialmente os materiais não-reforçados, foi possível constatar que quase não se pode observar nenhum efeito no caso dos graus de policarbonato (PC) e a poliamida (PA) aqui selecionados. Por sua vez, o polipropileno (PP) mostrou um ligeiro aumento de resistência de 8%, enquanto o poliestireno (PS) apresentou uma enorme elevação de até 350% (figura 5). Aqui foi assumido que o alto peso molecular do PS foi a causa para esse aumento considerável da resistência mecânica.


Fig. 5 – Os resultados dos ensaios de tração em anel no caso de materiais não-reforçados mostram um aumento considerável para o caso do PS moldado com núcleo rotativo (Fonte: Hochschule Osnabrück)
 

No caso de materiais reforçados com fibras foi inicialmente investigada a influência geral da fração presente de fibras (figura 6). Uma comparação entre os resultados dos corpos de prova não-rotacionados, feitos com diferentes materiais, mostrou que, como já era esperado, as amostras de PP com 10% de fibras de vidro apresentaram resistência mecânica mínima. No entanto, os corpos de prova com fração em peso de fibra igual a 20% mostraram resistência maior do que os corpos de prova que tinham 30% de fibras.

Investigações preliminares mostraram, por meio de imagens de tomografia computadorizada de corpos de prova não-rotacionados, que a maior parte da orientação das fibras se encontra na direção do fluxo. Isto significa que, quando uma carga é aplicada na direção circunferencial, como no ensaio de tração de anéis, muitas fibras encontramse na direção transversal à da carga mecânica aplicada. Quando um plástico compósito reforçado com fibra é solicitado transversalmente à direção da fibra, ocorre o chamado efeito do aumento do alongamento(4,5). Trata-se de um fenômeno que ocorre nos plásticos reforçados com fibras, caracterizando-se pelo fato de que, quando carregada transversalmente à fibra, a matriz assume uma parte maior da tensão do que a fibra. Isso significa que aqui o efeito de reforço das fibras orientadas circunferencialmente e o efeito de aumento do alongamento das fibras orientadas na direção do fluxo se contrapõem.


Fig. 6 – Os resultados dos ensaios de tração em anelapresentaram a influência da fração de fibras. O aumentocaso da PA reforçada com fibras de vidro longas (Fonte:para os materiais reforçados com fibras máximo, de quase 120%, ocorreu para o Hochschule Osnabrück)
 

O efeito do aumento de alongamento fica mais aparente no caso onde há altas frações de fibras de vidro, razão pela qual os corpos de prova feitos com PP-GF30 apresentaram resistência mecânica tangencial menor do que os feitos com PP-GF20. Em contraste com os corpos de prova não-rotacionados, o material com maior fração de fibra de vidro também apresentou máxima resistência tangencial no caso dos corpos de prova rotacionados. Portanto, é óbvio que o efeito do aumento de alongamento nos corpos de prova rotacionados foi muito pequeno devido à solicitação mecânica na direção da fibra. Como este efeito ocorre com fibras orientadas transversalmente à direção da carga, consequentemente tem-se aqui uma evidência de que a fabricação usando um núcleo rotativo está marcantemente associada à orientação tangencial das fibras. Também aqui pode ser observado que aumentos significativos de resistência mecânica somente ocorreram para frações de fibras acima de 20%.

No caso do PP- GF30 e da PA-GF50, reforçados com fibras curtas, o aumento da força quando se aplicou a rotação foi de aproximadamente 30%. No caso da PA-LGF60 reforçada com fibra longa foi alcançado um aumento de quase 120% (figura 6). Estes resultados obtidos nos ensaios mecânicos de tração de anéis também podem ser verificados usandose tomografia computadorizada.

Para se efetuar uma comparação entre as amostras confeccionadas de maneira convencional com as produzidas usando-se o núcleo rotativo, são mostrados na figura 7 os graus de orientação tangencial, axial e radial das fibras através da espessura normalizada da parede de ambas as amostras. Uma análise integral dos resultados mostra que o grau médio de orientação tangencial foi mais do que duplicado ao se utilizar o núcleo rotativo. O grau médio de orientação axial foi reduzido pela metade, enquanto o radial foi diminuído em 40%.


Fig. 7 – O grau de orientação das fibras determinadocomputadorizada provou que a fração tangencialrotação (Fonte: Hochschule Osnabrück) pelos resultados de tomografia das fibras é fortemente aumentada pela

 

Conclusões

O conceito de núcleo rotativo foi implementado com sucesso. Inicialmente a rotação foi limitada à fase de injeção. Entre os vários parâmetros de processo, particularmente a velocidade do núcleo exerce influência significativa sobre a resistência mecânica. Sob velocidades mais altas as orientações moleculares e das fibras são defletidas de maneira mais intensa, fazendo com que ocorra aumento da resistência mecânica na direção circunferencial. A princípio a resistência tangencial também depende da fração de fibras. No caso de corpos de prova não-rotacionados, a ocorrência do aumento de alongamento sob cargas transversais à orientação principal das fibras impede que maiores frações de fibras promovam maiores valores de resistência mecânica. Esta desvantagem pode ser evitada pelo uso do núcleo rotativo.

A posição em que foram extraídos os corpos de prova reforçados com fibras curtas mostrou que a resistência mecânica tangencial do componente ao final da trajetória do fluxo de resina fundida (longe do seu ponto de entrada do molde) foi significativamente maior do que nas outras posições (centro e próximo do ponto de entrada da resina fundida no molde). Aqui não foram mostrados os gráficos dos resultados. Também não foram apresentados aqui os resultados dos ensaios de pressão de ruptura, mas eles confirmaram claramente aqueles obtidos nos ensaios de tração de anéis.

 

Agradecimentos

Este trabalho de pesquisa (FKZ: ZF4153401LL5) teve o apoio financeiro do Ministério Federal de Economia e Energia (Bundesministerium für Wirtschaft und Energie – BMWi ) dentro d o âmbito do “Programa Central de Inovação para Empresas d e Médio Porte” ( Zentrales Innovationsprogramm Mittelstand – ZIM). Além disso, os autores agradecem à H. Sundermeier GmbH, de Hüllhorst, Alemanha, que foi uma parceira ativa de cooperação neste projeto, na pessoa do supervisor do projeto, Oliver Seeburger. Os agradecimentos também se estendem às empresas Arburg GmbH + Co KG, de Lossburg, Alemanha, pelo fornecimento de uma injetora, bem como à Ems-Chemie AG, de Domat/Ems, Suíça, e à A. Schulman GmbH, de Kerpen, Alemanha, pelo apoio no fornecimento de grânulos plásticos. Finalmente, os autores agradecem a Uwe Becker, Diretor Geral da MKS-Kunststoffspritzguss GmbH, de Lüdenscheid, Alemanha, por seu acompanhamento consultivo do projeto.


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