Componentes mecânicos com melhores desempenhos são cada vez mais requisitados na indústria. Os revestimentos duros de carbeto de tungstênio são alternativas que proporcionam maior durabilidade a chapas de aço utilizadas em ambientes abrasivos. Diante de diversos processos de aplicação disponíveis no mercado, busca-se contribuir para a seguinte questão de pesquisa: Qual processo de revestimento de chapas de aço apresenta melhor desempenho para a melhoria de propriedades? Um dos aspectos que justifica e torna este estudo relevante é a possibilidade de auxiliar empresas na tomada de decisão qualificada, frente a diferentes processos disponíveis para revestir chapas de aço. Existem poucos estudos que apresentam, de uma maneira prática, a comparação dos resultados de diferentes processos de revestimentos duros. 

Assim, este trabalho compara a eficiência de revestimentos de carbeto de tungstênio produzidos por soldagem oxiacetilênica e por aspersão térmica (HVOF, de high velocity oxygen fuel) frente ao desgaste por abrasão. 

 

Fundamentação teórica 

Nesta seção são apresentadas definições e aplicações dos revestimentos, bem como a caracterização de processos de revestimento com carbeto de tungstênio (WC). O revestimento duro pode ser descrito como uma alternativa para obtenção de propriedades, por meio da aplicação de uma camada de certo material sobre uma superfície, com o objetivo que ela apresente alta resistência ao desgaste. O revestimento é depositado em superfícies que serão submetidas a algum tipo de desgaste como, por exemplo, por abrasão (15,19). Dentre os principais setores que usam esses revestimentos estão o aeronáutico, aeroespacial, automotivo e petroquímico, entre outras áreas. 

Geralmente, aplica-se o revestimento nas superfícies antes destas entrarem em operação, minimizando assim paradas de equipamentos para substituição de peças. Ligas especiais resistentes ao desgaste têm sua vida útil aumentada em até dez vezes em comparação ao metal sem revestimento (22,24,29). Existem diferentes tipos de materiais para deposição disponíveis no mercado. Uma das categorias de materiais utilizados é conhecida como cermeto, que apresenta fases mistas de cerâmica e metais. Geralmente, é usado o carbeto de tungstênio envolvido com uma matriz de níquel ou cobalto, disponibilizando as melhores características do material metálico e cerâmico. Também são usados em grande escala o cromo e diversas ligas metálicas (1,9,29). Os métodos de aplicação dos revestimentos podem ser executados por soldagem como, por exemplo, oxiacetilênico e MIG/ MAG. Também pode ser aplicado por eletrodeposição ou laser. 

Atualmente, tem se desenvolvido a tecnologia de aspersão térmica, que pode ser realizada por processo hipersônico oxy-combustível de alta velocidade (HVOF) e Arc Spray, entre outras (15,25). O carbeto de tungstênio (WC) é um material cerâmico de grande importância devido às suas propriedades únicas. Possui alta dureza e excelente resistência ao desgaste, bem como apresenta estabilidade dimensional e térmica, além de boa resistência à corrosão. A resistência ao desgaste é sua principal característica e devido a isso é usado em diversas áreas na indústria (2,16,20). A temperatura de fusão do WC é de 2.800°C e a dureza é bastante elevada, variando de 1.800 a 2.200 HV. Um dos aspectos negativos nas propriedades do material é a brusca queda de dureza com o aumento da temperatura, que é significativa a partir da temperatura de 400°C (2,5,6,27). O WC também apresenta bastante fragilidade. Sua tenacidade pode ser aumentada pela inclusão de uma matriz metálica dúctil, podendo ser cobalto, níquel ou ferro. Na maioria das aplicações é usado cobalto ou níquel e, em pequena escala, o ferro. A matriz metálica atua como uma ligante, isolando as partículas de carbeto umas das outras e prevenindo a propagação de trinca de uma partícula para outra (9,26,27,31). A combinação do WC com um metal ligante forma um compósito de cerâmica-metal chamado de cermeto, cuja combinação de fases (matriz e particulada) o torna resistente a altas temperaturas. 

 Os materiais juntos apresentam excelentes propriedades, de modo que nenhum deles poderiam proporcionar isoladamente (9,26, 31)

O cobalto apresenta maior molhabilidade (capacidade de se manter em contato) com partículas de WC e maior dureza em relação ao níquel. Embora os cermetos com matriz de cobalto sejam usados em grande escala, há um grande problema quanto a disponibilidade desse material, pois ele é raro e seu custo é bastante elevado (31). Tratando-se de materiais para revestimentos duros, os cermetos com matriz à base de níquel também são amplamente usados para aumentar a vida útil de equipamentos submetidos ao desgaste por abrasão (4)

Estudos mostraram que o níquel como ligante dissolve menos tungstênio do que o cobalto, apresentando menor dureza e resistência na fase ligante em relação ao cobalto. Para melhorar as características da fase ligante à base de níquel é necessário adicionar elementos de liga que elevam a sua dureza. Assim, podem ser utilizados manganês, cromo, molibdênio, nióbio, ferro, silício e alumínio, tendo em vista sua boa solubilidade no níquel (13,27,28)

 

Fatores que influenciam na resistência ao desgaste 

Os estudos que investigam os revestimentos duros, em geral, citam a microestrutura e a dureza como aspectos importantes na avaliação da resistência ao desgaste. A dureza do revestimento depende da sua microestrutura e composição química. Assim, a avaliação com medição de dureza deve levar em consideração a estrutura heterogênea dos revestimentos (3,4,30)

A eficácia do revestimento depende significativamente da microestrutura resultante, onde a quantidade de partículas duras determina a resistência ao desgaste das ligas. Em estudos realizados, a microestrutura provou ser mais importante que a dureza na determinação da resistência à abrasão. Quanto maior a quantidade de partículas duras, maior a resistência ao desgaste (4,7,8,18,32). O ideal é que a maioria das partículas de carbeto de tungstênio apresente morfologia irregular, com bordas afiadas, e que a micrografia apresente partículas abundantes de WC, distribuídas de forma uniforme (4,14,23,32)

Estudos também mostram que a presença abundante de ferro (Fe) no revestimento reduz a dureza e afeta a resistência ao desgaste, assim como a degradação e a quantidade de WC são fatores microestruturais que influenciam diretamente na resistência (4,11,17,32,34)

A tabela 1 mostra valores de microdureza que evidenciam que a amostra A, que sofreu maior aquecimento (alta corrente de soldagem), apresentou menor dureza devido à mistura com ferro da chapa metálica. Além disso, foi constatado menor teor de WC de forma significativa, e como consequência desses fatores foi a amostra que sofreu maior desgaste (4). Conforme mostra a tabela 1, o aporte de temperatura do processo também reduziu o teor de carbeto de tungstênio para 23,3% devido à dissolução de WC. Quanto menor o grau de dissolução e degradação de WC, melhores as propriedades mecânicas do revestimento, dado que os revestimentos com maior volume de partículas duras apresentaram maior resistência ao desgaste (4,14,23,32)

 

 

Em um estudo sobre o revestimento por plasma com WCNi, constatou-se que a radiação térmica intensiva na fusão do pó resultou na degradação dos carbetos de tungstênio. Devido à entrada intensa de calor na superfície, ocorreu a formação de fases com formato semelhante a agulhas na microestrutura. Essas fases podem ser Fe3W3C ou Ni2W4C, as quais conferem fragilidade à matriz (11,17,32,34). 

 

Metodologia 

Nesta seção são apresentados os procedimentos de preparação das amostras, assim como os ensaios que foram executados e os métodos para definição e interpretação dos resultados. As amostras foram revestidas por soldagem oxiacetilênica e por aspersão térmica HVOF, processos que foram selecionados devido à disponibilidade de fornecedores. Para avaliar a aplicabilidade dos dois métodos no revestimento de chapas de aço, foram cortadas a laser duas peças de aço SAE 1045, com dimensões de 60 mm x 60 mm e espessura de 3/8” (9,53 mm), e mais duas peças com formato de pás para uso no teste de desgaste. 

As amostras foram submetidas ao jateamento com granalha de óxido de alumínio para remoção total de óxidos, graxas e outros elementos contaminantes. Na soldagem oxiacetilênica foi usada vareta flexível de WC-19Ni e na aspersão térmica HVOF foi utilizado pó de WC-17Co. As matrizes usadas foram diferentes (níquel e cobalto) devido à disponibilidade de mercado das matérias-primas aplicadas em cada processo. 

As amostras quadradas foram revestidas somente em uma face com 30 mm x 30 mm, enquanto as amostras com formato de pá tiveram revestidas as duas faces e as laterais até a metade do seu comprimento total. 

Visando obter menor diferença de espessura de revestimento, a soldagem oxiacetilênica foi executada na mínima espessura possível, enquanto o processo HVOF foi executado com a máxima camada permitida. Para avaliar as propriedades mecânicas e morfológicas, as amostras n°1 foram medidas com um micrômetro a fim de conhecer as espessuras resultantes dos revestimentos. As amostras foram medidas em cinco regiões distintas abrangendo as áreas de maiores e menores espessuras. Em cada região foram executadas três medições diferentes, obtendose a média e o desvio-padrão desses resultados. Posteriormente, as amostras foram seccionadas transversalmente pelo processo eletro a fio, que oferece menor aporte térmico durante o processo e melhor acabamento de corte (4,21)

Posteriormente foi feita a preparação metalográfica das superfícies transversais, iniciando com lixamento das amostras com lixas d’água de granulometria 100, 200, 400, 600 e 1.000, respectivamente (30,33). Em seguida, a superfície foi polida com o auxílio de uma máquina politriz com aplicação de pasta de alumina, obtendo uma superfície espelhada para a análise. 

Antes da análise microestrutural as amostras foram atacadas quimicamente. A amostra revestida por soldagem oxiacetilênica (matriz de níquel) foi atacada com ácido nítrico alcoólico a 5% vol. durante aproximadamente cinco segundos, e posteriormente imergida em álcool etílico hidratado. Foi secada com soprador térmico (4)

A amostra revestida por HVOF (matriz de cobalto) foi atacada quimicamente com uma mistura de água, ácido nítrico, ácido acético e ácido clorídrico, na proporção de 15:15:15:60, em ml (30,33).

Após, as amostras foram posicionadas no microscópio eletrônico de varredura (MEV) JEOL 5800 do laboratório do IFSul para captura das imagens microestruturais, e pelo software Image J foram determinadas as quantidades de carbeto de tungstênio em porcentagem de área, sendo analisadas três áreas distintas de cada amostra e calculada a média de desviopadrão dos resultados obtidos. As microestruturas foram comparadas com imagens da literatura, buscando identificar possíveis degradações de carbeto, por meio de formações de fases agulhadas que afetam a resistência ao desgaste. 

Para medições de microdureza Vickers foi usado o equipamento 400.310 Digimess, sendo realizadas dez medições nas seções transversais da amostra, contemplando desde a linha de fusão do revestimento na amostra até a superfície (21). As medições foram realizadas com a carga de indentação de 0,5 kgf. Devido às características operacionais disponíveis no equipamento, utilizou-se a carga mais próxima da indicada na literatura (4), que é de 0,4 kgf. Para a definição do valor final de microdureza de cada amostra foi realizado o cálculo da média e desvio-padrão das dez medições. Para avaliar o desgaste foi realizado um ensaio de forma empírica, submetendo as amostras n° 2, em modelo de pás, a um ambiente abrasivo com carbeto de silício (SiC), simulando o funcionamento de um misturador com rotação de 40 rpm (Tschiptschin et al., 2020). 
 
A figura 1-A mostra a montagem do sistema de teste, em que foi usado um motor elétrico com redutor e um eixo acoplado ao redutor com sistema para fixação das duas pás, uma revestida por soldagem oxiacetilênica e outra por aspersão térmica HVOF, e um reservatório para o material abrasivo (SiC). Nesse sistema as pás ficam em movimento rotativo em contato com o SiC. As espessuras dos revestimentos das pás foram medidas com um micrômetro externo. As medições foram executadas em dez pontos distintos utilizando um gabarito abrangendo diferentes áreas, conforme pode ser visto na figura 1-B. O gabarito posicionado em cima da pá garante a medição de espessura sempre nos mesmos dez pontos de medição numerados e identificados na figura 1-B, à direita. Para avaliar o desgaste no ambiente abrasivo, as medições foram executadas antes de iniciar o teste e esses valores de espessuras foram acompanhados após 150, 300, 450 e 600 horas. 
 

 

 

Fig. 1 – (A) sistema montado para teste empírico de desgaste abrasivo e (B) pá com gabarito de medição.


 

Resultados e discussão 

Nesta seção são apresentados os aspectos visuais observados nas amostras, bem como os resultados da análise morfológica, de microdureza e de resistência ao desgaste. 

 

Aspectos visuais e espessura 

Inicialmente pôde-se analisar os aspectos visuais dos revestimentos e determinar as espessuras resultantes dos dois processos de aplicação dos revestimentos duros com WC, por soldagem oxiacetilênica e por aspersão térmica HVOF. A amostra revestida pela soldagem oxiacetilênica apresentou irregularidades significativamente maiores em relação à amostra revestida por HVOF. Essas irregularidades podem ser observadas na espessura e delimitação do revestimento, assim como no acabamento superficial. Na figura 2 podem ser observadas as amostras revestidas, nas quais as regiões inferiores, em cinza mais claro, são as áreas revestidas, enquanto as regiões superiores, em cinza escuro, estão sem revestimento. 

As áreas sinalizadas em verde são as bordas de delimitação do revestimento, nas quais pode-se observar que na amostra revestida por HVOF (figura 2-B) a borda se apresenta significativamente linear, enquanto na amostra soldada (figura 2-A), essa região é irregular. 

Na figura 2-A as áreas circuladas em vermelho apontam as regiões com maiores irregularidades no acabamento, perceptíveis visualmente. A amostra revestida por HVOF apresenta uma superfície homogênea e uniforme sem pontos de irregularidades. 

Em relação às espessuras, considerando a regularidade dimensional das chapas metálicas (9,40 ± 0,02 mm), o revestimento duro na amostra produzida por HVOF apresentou espessura média de 0,67 ± 0,05 mm. Já a amostra revestida por soldagem oxiacetilênica apresentou espessura média de 1,79 mm ± 0,22 mm, sendo 62,5% maior em relação à amostra revestida por aspersão térmica. Além disso, observouse um desvio-padrão maior na amostra soldada (~ 12%), enquanto na amostra revestida por HVOF o desvio foi ~ 7%. 

Essa diferença atesta uma maior variação de espessura em uma pequena área de revestimento, sugerindo uma dificuldade na execução do processo, que depende consideravelmente da habilidade do operador. 

O revestimento aplicado pelo processo de aspersão térmica apresentou 0,17 mm (34%) de espessura maior que a camada máxima informada na literatura (21), que era de 0,5 mm. O aumento de espessura em relação ao especificado sugere variações no processo de aplicação, mesmo em menores escalas que o processo de soldagem. 
 

 

 

Fig. 2 – (A) amostra revestida por soldagem oxiacetilênica e (B) amostra revestida por aspersão térmica HVOF.

 

Morfologia, dureza e desgaste 

A microestrutura resultante do processo de soldagem oxiacetilênica pode ser visualizada na figura 3, onde as partículas de WC aparecem em cinza claro, dispersas na matriz de níquel (cinza médio), sendo a chapa revestida mostrada à esquerda. 

 

 

Fig. 3 – Microestrutura da amostra revestida com WC-Ni por soldagem oxiacetilênica.

 

As maiores partículas de WC encontradas foram identificadas na imagem, sendo a maior delas com comprimento de 0,979 mm. Podese observar também que na região da superfície do revestimento há uma redução significativa da quantidade de partículas duras, o que pode representar uma migração de WC decorrente da alta temperatura de processo (4)

A amostra soldada apresentou partículas de diferentes formas (figura 4), onde puderam ser visualizadas algumas fases em formato de agulhas, o que é um indicativo de fragilidade do revestimento (11,17,32,34). A microestrutura da amostra revestida por aspersão térmica é mostrada na figura 5, na qual a chapa metálica aparece à esquerda e o revestimento em cinza claro mesclado com cinza mais escuro. 
 

 

 

Fig. 4 – Microestrutura transversal da amostra WC-Ni soldada com fases agulhadas.


 
A linha verde à esquerda (figura 5) identifica o ponto de contato do revestimento com a chapa metálica, sendo mostrada uma irregularidade nessa área, o que pode ser decorrente de uma deformação da chapa metálica devido à velocidade supersônica de contato das partículas do revestimento com a chapa metálica, que chega a 1.200 m/s (12,25). 
 

 

Fig. 5 – Microestrutura transversal da amostra revestida com WC-Co por HVOF.

 

A figura 6 possibilita a identificação das fases duras e da matriz do revestimento por aspersão térmica HVOF, sendo as partículas de WC mostradas na cor cinza claro, dispersas na matriz de cobalto (cinza escuro). As maiores partículas de WC encontradas foram identificadas na imagem, sendo a maior delas com comprimento de 0,007 mm, o que representa 0,71% do tamanho da maior partícula encontrada na amostra revestida por soldagem. 
 

 

Fig. 6 – Microestrutura da amostra revestida com WC-Co por HVOF.

 

Pode-se verificar que a distribuição de WC é abundante e uniforme e não são identificados sinais de degradação das partículas duras (formato de agulhas), sendo essas características da microestrutura favoráveis à obtenção de uma maior resistência ao desgaste (4,14,23,32)

Para determinação da quantidade de WC a área das partículas foi quantificada por software de tratamento de imagens. Na amostra revestida por soldagem foram analisadas três áreas com características de distribuição de partículas distintas (figura 7). A região à esquerda apresenta partículas maiores e 33,29% de WC, a região central se caracteriza pela presença de partículas menores e 35,25% de WC, ao passo que a área da direita, que corresponde à região da superfície do revestimento, em que há escassez de partículas duras, apresenta apenas 7% de partículas de WC. A imagem da amostra revestida por aspersão térmica HVOF foi dividida em três partes no sentido vertical para análise da quantidade de WC, pois a distribuição de partículas se apresentou uniforme. A figura 8 mostra as três regiões com as respectivas quantidades de WC, cujas quantidades de área são semelhantes, apresentando uma média de 59,43% +/- 1,22. 
 

 

Fig. 7 – Regiões de análise (software) da quantidade de WC da amostra revestida por soldagem.

 

Fig. 8 – Regiões de análise (software) da quantidade de WC da amostra revestida por aspersão térmica HVOF.

 

Na tabela 2 pode-se verificar a diferença de quantidade de WC, de microdureza e desgaste das amostras revestidas com WC-Ni por soldagem oxiacetilênica e com WCCo por HVOF. Foi constatado que a amostra revestida por soldagem apresentou quantidade menor de WC em relação à amostra revestida por HVOF (menos do que a metade). Essa diferença é significativa e coerente com a microdureza observada, que foi muito maior na amostra revestida por HVOF. 

 

 

Os valores de microdureza resultantes para o revestimento soldado foram coerentes com o valor da literatura, que era de 370 HV (10). Para a amostra revestida por aspersão térmica o resultado foi significativamente maior que 1.300 HV, informado na literatura (21). A microdureza resultante em todos os pontos dessa amostra atingiu o valor da partícula isolada de WC (1.800-2.200 HV), o que pode indicar que a área de ~ 40% da matriz de cobalto está organizada em muitas pequenas frações, uniformemente distribuídas no revestimento, de mais difícil acesso por partículas abrasivas. A tabela 2 mostra o resultado do teste prático para avaliação do desgaste dos revestimentos por soldagem oxiacetilênica e por aspersão térmica HVOF. A amostra soldada apresentou desgaste médio total de 0,22 mm ao final das 600 horas de ensaio, enquanto na amostra revestida por HVOF o desgaste médio total foi de 0,04 mm, que é 81,8% menor em relação à amostra soldada. 

A figura 9 mostra a pá soldada e o desgaste após o teste. A região mais escura da pá (circulada em vermelho) apresentou um desgaste perceptível visualmente, quantificado em 0,64 mm, mostrado no ponto 10 de controle de espessura. A pá revestida por HVOF apresentou desgaste maior que 0,09 mm, no ponto 4, não sendo possível perceber esse desgaste visualmente. Na figura 10 pode-se observar na área verde o desgaste médio total ao longo das 600 horas de ensaio e a na área amarela a projeção do desgaste total dos revestimentos. O gráfico mostra que, em todos os intervalos de tempo, a amostra soldada apresentou desgaste superior em relação à revestida por HVOF. 
 

 

Fig. 9 – Pá soldada após teste de desgaste.


 

De acordo com os dados obtidos no ensaio real foi possível definir a equação de tendência de desgaste para cada pá. As equações podem ser visualizadas no gráfico. A área clara à direita (figura 10) representa o gráfico de tendência de desgaste. 
 

 

 

Fig. 10 – Gráfico de desgaste total real e de tendência x tempo.

 

Constatou-se que o desgaste total do revestimento de uma das faces da pá soldada se daria ao final de 2.092,5 horas de ensaio, enquanto nesse mesmo tempo de ensaio a amostra revestida por HVOF apresentaria um desgaste de 0,14 mm, alcançando o seu desgaste total somente ao final de 7.857,1 horas. Ou seja, a vida útil dessa pá seria aproximadamente três vezes maior do que a da pá soldada. O desgaste maior foi observado na amostra soldada e esse comportamento pode ser associado à quantidade significativamente menor de WC, bem como à irregularidade na distribuição das partículas duras, conforme foi identificado na microestrutura e, consequentemente, à menor microdureza medida na amostra, sendo, nesse caso, o maior desgaste. O resultado é coerente com dados apresentados na literatura (4)

 

Conclusões 

Neste estudo, amostras foram revestidas com carbeto de tungstênio por soldagem oxiacetilênica e por aspersão térmica HVOF, sendo a espessura do revestimento aplicado por HVOF de 0,67 ± 0,05 mm, enquanto a amostra soldada apresentou 1,79 mm ± 0,22 mm, sendo 62,5% maior em relação à amostra revestida por HVOF. As propriedades mecânicas das amostras foram avaliadas. A amostra revestida por HVOF apresentou microdureza de 2.328,30 +/- 412,17 HV0,5, significativamente maior do que a da amostra revestida por soldagem, que foi de 493 +/- 65,65 HV 0,5. As análises morfológicas apontaram a presença de partículas de carbeto de tungstênio com área significativamente menor na amostra revestida por soldagem oxiacetilênica, de 25,27 +/- 12,74%, enquanto para a amostra revestida por HVOF o resultado foi de 59,43 +/- 1,22%. Além disso, pôde-se identificar uma grande uniformidade na distribuição das pequenas partículas duras na amostra revestida por aspersão térmica HVOF. O teste prático de desgaste possibilitou a comparação dos resultados. O revestimento aplicado por HVOF apresentou menor desgaste, de 0,04 mm em 600 horas, enquanto a amostra soldada desgastou 0,22 mm. A projeção de desgaste pressupõe que a amostra revestida por HVOF resiste, pelo menos, 2,5 vezes mais que a amostra revestida por soldagem oxiacetilênica nas condições de operação aplicadas neste estudo. 

 

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Análise das deformações principais em componentes automotivos estampados

Os atuais padrões de qualidade requerem a realização de ensaios normalizados para determinar a estampabilidade de chapas metálicas em processos de embutimento profundo. Os ensaios garantem que o material seja conformado sem apresentar defeitos como enrugamento, orelhamento ou rupturas localizadas. A Curva Limite de Conformação (CLC) é usada para avaliar a capacidade de deformação do material, indicando as deformações máximas que ele pode suportar. Quando as deformações de um componente estampado estão abaixo da CLC, o material pode suportá-las. Deformações acima da curva indicam risco de ruptura. Este artigo tem como objetivo determinar experimentalmente as CLCs do aço inoxidável austenítico AISI 304, usando três lubrificantes diferentes (Draw 58 GS, Neutron Super Corte 1123-21S e Flash Stamp 140) para analisar a influência do atrito nas curvas de conformação. Também foram realizadas simulações no software QFORM para avaliar o comportamento plástico de um componente automotivo estrutural estampado a frio.

19/08/2025


Análise das deformações principais em componentes automotivos estampados

Os atuais padrões de qualidade requerem a realização de ensaios normalizados para determinar a estampabilidade de chapas metálicas em processos de embutimento profundo. Os ensaios garantem que o material seja conformado sem apresentar defeitos como enrugamento, orelhamento ou rupturas localizadas. A Curva Limite de Conformação (CLC) é usada para avaliar a capacidade de deformação do material, indicando as deformações máximas que ele pode suportar. Quando as deformações de um componente estampado estão abaixo da CLC, o material pode suportá-las. Deformações acima da curva indicam risco de ruptura. Este artigo tem como objetivo determinar experimentalmente as CLCs do aço inoxidável austenítico AISI 304, usando três lubrificantes diferentes (Draw 58 GS, Neutron Super Corte 1123-21S e Flash Stamp 140) para analisar a influência do atrito nas curvas de conformação. Também foram realizadas simulações no software QFORM para avaliar o comportamento plástico de um componente automotivo estrutural estampado a frio.

13/05/2025


Soldagem MIG/MAG de chapas de aço ARBL com uso de delineamento Box-Behnken

O presente trabalho consiste no estudo e desenvolvimento do processo de soldagem MIG/MAG de passe de raiz com modo de transferência de metal goticular projetada em uma junta de topo tipo “V”, confeccionada em aço de alta resistência e baixa liga (ARBL) Quend 700 com 10 mm de espessura, em uma caçamba de empurre para mineração, na empresa Beltz do Brasil Ltda. Foi usado o delineamento de experimentos (DOE) do tipo Box-Behnken e os fatores variáveis foram velocidade de soldagem, distância do bico de contato à peça, e ângulo de deslocamento. Os valores de tensão e velocidade de arame foram fixados em 33 V e 8,5 m/min, respectivamente.

25/08/2023