Impulsionadas pelas diretrizes da União Europeia e por seus próprios programas de sustentabilidade, montadoras de veículos estão apresentando uma demanda cada vez maior por polímeros constituídos de material reciclado. A Volvo, por exemplo, projeta que em 2025 pelo menos 25% de todos os plásticos usados em seus veículos sejam feitos com material reciclado(1).

A reciclagem não é um tópico novo para a indústria automobilística. Durante muitos anos foram feitos esforços para reciclar rejeitos plásticos, tais como sucata proveniente da produção industrial, materiais provenientes do sucateamento de veículos, pallets usados para transportar e armazenar peças, além de embalagens. A fração de material reciclado presente em autopeças está aumentando continuamente, independentemente das discussões sobre a produção neutra em termos de gás carbônico. Contudo, o debate atual acelerou esse desenvolvimento.

O uso de polipropileno expandido em veículos, incluindo áreas críticas para a segurança, como dispositivos de proteção para passageiros e pedestres, está aumentando muito (JSP).

Um exemplo desse cenário é um sistema de reciclagem desenvolvido em parceria pela fabricante de materiais JSP International Sarl (França) e a empresa de reciclagem alemã General Industries Deutschland (GID). A GID coleta pallets feitos de polipropileno expandido (EPP) em montadoras e nas sedes de seus fornecedores, os recicla e fornece o material assim obtido à JSP, a qual usa esse material para fabricar grades de EPP da linha Arpro 5134 RE (tabela 1), os quais contêm 25% de material reciclado.

Tab. 1 – Propriedades físicas do grade de EPP Arpro 5134 RE, para concentrações em massa de 45 e 60 g/L (fonte: JSP).

Essa abordagem não só poupa recursos como também reduz as emissões de CO2 (e) em até 12% em relação ao material virgem, sem alterar as suas propriedades mecânicas ou a sua processabilidade. A sigla CO2 (e) significa “CO2 equivalente” e inclui as emissões de todos os gases que promovem o efeito estufa convertidos para CO2 (e).

 

Avanço do EPP nos automóveis

A busca pela ampliação da autonomia dos automóveis elétricos e pela redução das emissões de gás carbônico está fazendo com que a participação do plástico usado na indústria automobilística aumente. Atualmente, até 50% do volume de veículos são constituídos de plástico. Em termos de peso, a atual fração de polímeros é da ordem de 18%. As previsões indicam que provavelmente esse valor aumentará para 25% em 2027(2-4).

Cerca de 70% dos plásticos usados pelas montadoras consistem em grades de polipropileno (PP), poliuretanos (PU), poliamidas (PA) e poli(cloreto de vinila) (PVC)(5). Graças à sua versatilidade, o PP pode ser usado em muitos tipos de aplicação e representa até 30% dos plásticos empregados em um veículo. Ele também vem sendo muito utilizado na forma de polipropileno expandido (EPP) (figura no início do artigo). De forma similar, a sua aplicação está ganhando importância, por exemplo, na forma de peças absorvedoras de impacto para segurança de passageiros e pedestres. Esse material é particularmente adequado para a proteção de passageiros devido à sua estrutura de espuma com células fechadas, o que assegura boa absorção de energia sob múltiplos impactos.

Fig. 1 – Em comparação com o EPP virgem fornecido pela JSP, um quilo de EPP contendo 25% de material reciclado gera 12% menos emissões de gás carbônico (fonte: JSP).

A JSP fornece grades de EPP constituídos de 15% de material reciclado que são produzidos a partir de embalagens e sucata proveniente de produção industrial. No entanto, estes produtos eram usados apenas em aplicações de nicho, tais como guarnições para isolamento(6). Para atender à crescente demanda europeia, a JSP estabeleceu um sistema de laço fechado para peças moldadas em EPP ao final de sua vida útil(7). O objetivo aqui é, independentemente do fabricante original do material utilizado, aproveitar as peças moldadas e reinseri-las na produção de material.

E é aqui que entra a parceria da JSP com a GID. Para implantar uma cobertura nacional para o processamento de plásticos descartados, a GID usa suas unidades produtivas, opera plantas em outras empresas de montagem OEM (Original Equipment Manufacturer ou fabricante de equipamentos originais, em tradução livre), se utiliza de instalações móveis de reciclagem e trabalha com empresas parceiras. Somente no setor automobilístico, a GID converte 12.000 t/ano de rejeitos plásticos (tabela 2) em material reciclado de alta qualidade (na forma de grânulos, aglomerados e formulações, por exemplo).

Tab. 2 – Rejeitos plásticos processados pela GID para o setor automobilístico, subdivididos de acordo com os materiais (fonte: GID).

As embalagens recicláveis provenientes do setor automobilístico como pallets, em particular, que somam um volume de cerca de 4.500 t/ano na Europa, são uma importante fonte de material para o sistema circular (figura 2). Pallets feitos em EPP são engradados retornáveis usados para acondicionar componentes de veículos. A maioria deles são feitos sob medida, projetados conforme componentes de modelos específicos de veículos. Quando a produção de um determinado modelo de veículo é encerrada, todos os engradados são sucateados ou descartados.

Fig. 2 – Os pallets em desuso são coletados, compactados e então granulados (JSP).

Os pallets para componentes que são substituídos após reestilização parcial são usados, na maioria das vezes, durante três ou quatro anos. Com a introdução de um novo modelo, todos os engradados de EPP são sucateados após quatro ou seis anos.

 

Sistema circular com empresas OEM

A GID tem operado um sistema inteligente de reciclagem juntamente com empresas OEM como, por exemplo, Volkswagen, Audi, Seat, Skoda, Daimler e Opel. A GID discute preliminarmente o plano de descontinuidade do pallet com o gestor da empresa OEM com o objetivo de reduzir os custos de transporte e referentes a emissões de gás carbônico. Também são considerados os desafios enfrentados pela empresa OEM no que diz respeito aos pallets. Eles apresentam grande volume e baixo peso devido ao fato de serem feitos em EPP. Geralmente, o armazenamento deles está fora de questão devido à falta de espaço.

Além disso, o transporte de pallets é muito ineficiente e caro. Devido a isso, a GID frequentemente trabalha compactando o EPP nas plantas das firmas OEM onde os pallets se encontram vazios. O desempenho de compactação dessas unidades é de 150 kg/h, enquanto aglomeradores especiais de EPP chegam a taxas de até 400 kg/h. Dessa forma, o baixo peso dos contentores não-compactados feitos em EPP, de apenas 1,2 t por caminhão, pode ser aumentado para 22 t por caminhão.

As empresas OEM encaminham o montante acumulado diretamente para centros de coleta localizados em diversas cidades da Alemanha. Além disso, essa rede inclui companhias parceiras na Polônia, República Tcheca, Hungria, Eslováquia, Áustria e Espanha, por exemplo.

Os pallets feitos em EPP são classificados conforme rigorosos padrões de qualidade para assegurar o nível necessário para o processamento no produtor de materiais, para o processo de expansão do fabricante de componentes moldados e para atender às especificações das montadoras. Particularmente, devido ao fato de a reciclagem de materiais ser independente do fabricante, a GID administra os fluxos de materiais ao longo de toda a cadeia.

A classificação da qualidade é feita de acordo com os seguintes critérios:

Apenas pallets com cor preta e sem descarga eletrostática, rótulos e matéria estranha são classificados com qualidade “A”. Todos os outros são classificados com qualidade “B”.

Após a classificação e a compactação dos pallets de EPP, de acordo com os critérios de qualidade, eles são transformados em grânulos na planta da GID situada em Eschwege, Alemanha (figura 3). A GID analisa o material reciclado em seus próprios laboratórios em termos de propriedades-chave, tais como o índice de fluidez do fundido, resistência ao impacto de corpos de prova entalhados, resistência à tração e fração de cargas. Isso assegura que o material atenda às severas especificações do ramo automobilístico.

Fig. 3 – Na planta de Eschwege (Hesse) os pallets coletados são convertidos na forma de EPP granulado e subsequentemente analisados no laboratório para investigar suas propriedades-chave (GID).

Um alto grau de garantia da qualidade é necessário, tanto por parte do reciclador quanto pelo fabricante do material, para permitir que os polímeros reciclados sejam usados na fabricação de autopeças que sejam relevantes para a segurança. A GID e a JSP asseguram que sejam alcançados níveis equivalentes de propriedades mecânicas, emissões e as mesmas características de flamabilidade observadas no material virgem. Portanto, os componentes feitos com o grade Arpro 5134 RE (figura 4) também podem ser usados em para-choques e dispositivos para proteção de pedestres (figura 5).

Fig. 4 – O grade Arpro 5134 RE pode ser processado usando-se o método de preenchimento por trinca ou pressão, com ou sem carregamento sob pressão (fonte: JSP).

Fig. 5 – Análise por elementos finitos usando software LSDyna: áreas relevantes para a segurança do automóvel, como o dispositivo para proteção de pedestres mostrado nesta figura, são testadas por simulação. A área em cor vermelha na figura é constituída por EPP e absorve parte da energia em caso de colisão, por exemplo, com a perna de um pedestre (JSP).

Anteriormente, na maioria dos casos em que eram usados plásticos contendo alguma fração de material reciclado, os fabricantes de componentes evitavam usá-los em aplicações relevantes à segurança. Isso decorria principalmente da ampla variação das propriedades mecânicas, tais como alongamento total e limite de resistência. Para que esses plásticos pudessem ser usados nessas aplicações, eles precisavam apresentar desempenho consistente e exibir propriedades bem mais constantes.

No futuro, os materiais que contenham frações de reciclado também precisarão atender a critérios de qualidade referentes aos materiais virgens. Isso somente poderá ser feito se o produtor e o reciclador do material trabalharem de forma cooperativa.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

As referências bibliográficas referentes a esse trabalho podem ser encontradas no seguinte endereço da internet: http://www.kunststoffe.de/2020-01.


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