O novo marco legal do saneamento, cuja proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados no final de outubro de 2019, prevê aumento da participação da iniciativa privada neste importante segmento da infraestrutura, com intensificação das ações rumo a uma sensível melhora dos indicadores nacionais do saneamento nos próximos 14 anos. A iniciativa trouxe à tona uma enorme demanda reprimida durante anos por instalações para abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto, nas quais os plásticos são imprescindíveis, e que ficou ainda mais evidente em decorrência da intensa propagação da Covid-19 em áreas mais carentes desse serviço essencial.

 

A revista Plástico Industrial publicou em dezembro do ano passado um apanhado das oportunidades que o novo marco representa para o setor. Cabe agora rever o tema, tendo em vista a realidade pós-pandemia que se avizinha e que exigirá ainda mais atenção ao tema. Um desafio adicional agora é contornar a crise que se estabeleceu entre os Três Poderes, complicando o destravamento desta agenda, da qual faz parte uma intensa articulação política para garantir um direito fundamental dos cidadãos.


Saneamento e IDH

O acesso ao saneamento básico está diretamente associado à saúde da população, e por isso é um dos parâmetros para a medição do índice de desenvolvimento humano (IDH), usado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) para ranquear países no que se refere à qualidade de vida de seus habitantes, no qual o Brasil ocupa hoje a 79ª posição.
 

Embora não esteja entre as piores, essa classificação está muito longe de espelhar a isonomia no cuidado com o bem-estar da nossa população. Ao contrário disso, o índice expõe históricos contrastes regionais: ao mesmo tempo em que algumas localidades têm um padrão comparável ao de países desenvolvidos, em outras observa-se uma situação de calamidade. Dados da Organização Mundial da Saúde apontam cerca de 4 milhões de brasileiros que não têm sequer acesso a banheiros, o que mostra o quanto estamos distantes da universalização, termo usado para definir a garantia de acesso de toda a população aos principais serviços de saneamento: abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto.

 

Segundo os números oficiais do Governo Federal, aproximadamente 35 milhões de pessoas – o equivalente à população do Canadá – não têm acesso à água potável e quase 100 milhões de pessoas ainda vivem em moradias sem acesso a saneamento – o dobro da população da Espanha. Um total de 46% do esgoto gerado é tratado, sendo o restante despejado diretamente na natureza. E apesar de 85% dos brasileiros terem acesso à água tratada, aproximadamente 35% dela se perdem antes de chegar aos lares, dados que ilustram quanto trabalho há em vista no horizonte quando o assunto é cuidar dos recursos hídricos, do seu uso e destinação correta dos resíduos.

 

Melhorar esses indicadores deveria ser pauta constante de todo e qualquer governo, com o compromisso de continuidade dos trabalhos, independentemente de qual grupo ou partido ocupe o poder temporariamente. No entanto, não é isso o que acontece na prática. A implementação de políticas públicas de saneamento, por envolver grandes volumes de recursos e investimentos, continua sendo objeto de decisões políticas orientadas por interesses imediatos.

 

A mais recente decisão de impacto a respeito dessa política pública foi a aprovação, no final do outubro, pela comissão especial da Câmara dos Deputados da proposta do novo marco legal do saneamento, prevendo a exploração dos serviços a ele relacionados (abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto, limpeza urbana, redução e reciclagem de lixo) pela iniciativa privada, a ser atraída sobretudo por um ambiente de segurança jurídica para atuar. O texto foi endossado pela Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura (SDI), e o Governo Federal estima que a medida possa atrair mais de R$ 500 bilhões em investimentos privados no setor e gerar em torno de 700 mil empregos nos próximos anos. Por isso a grande expectativa em torno de sua votação.

 

O que prevê o novo marco

O relatório aprovado pela Câmara em outubro do ano passado prevê a entrada da iniciativa privada na prestação de serviços de saneamento e fixa o prazo de um ano para a licitação obrigatória dos serviços. Nesse período, as empresas estatais de água e esgoto poderão renovar os contratos vigentes firmados com os municípios sem licitação, por até 30 anos. Porém, novos contratos desse tipo não poderão ser firmados a partir da aprovação da lei.

 

De acordo com o texto, os contratos de saneamento deverão definir metas de universalização que garantam o atendimento de, respectivamente, 99% e 90% da população com água potável e coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033. Os contratos em vigor sem essas metas terão um ano para se adaptar. Já os novos contratos, decorrentes da licitação, estarão condicionados à comprovação da capacidade das empresas para atingir essas metas. O texto também define a Agência Nacional de Águas (ANA) como reguladora das atividades das empresas, resolvendo impasses e possibilitando que municípios menores se unam para garantir a viabilidade econômico-financeira de um projeto.

 

Seja pelas mãos da iniciativa pública ou privada, o importante é que a rede de saneamento cresça e que os seus benefícios cheguem a todos os cidadãos, e isso abre novas oportunidades para os processadores de plásticos que atuam na fabricação de tubos, conexões e demais itens usados na instalação dessa rede.

 

Plásticos no contexto

Na prática, o novo marco significa um mercado se estruturando em torno da instalação de quilômetros e quilômetros de rede para condução de água potável e tratamento de esgoto, sendo boa parte composta por tubos poliméricos. A Associação Brasileira de Tubos Poliolefínicos e Sistemas (ABPE), estima um crescimento anual entre 8% e 10% no consumo desses itens nos próximos cinco anos e, a partir daí, um crescimento de 2 a 3% ao ano até a universalização.

 

O setor de tubos e conexões plásticas já dispõe de boa capacidade para atender o mercado nos próximos anos, mas é provável que novos investimentos em maquinário e ampliação de plantas fabris sejam necessários no médio prazo.

 

De acordo com Mauricio Mendonça de Oliveira, presidente da associação, as soluções de PE ganharam espaço em relação aos materiais tradicionais e isso ocasionará um crescimento não apenas devido ao maior nível de investimentos, mas também pelo aumento do market share dos produtos no mercado de saneamento.


Para ele, a cadeia de transformação e de instalação dos tubos de polietileno está mais que preparada para o crescimento da demanda na direção da universalização da água e do esgoto. Existem hoje quatro fabricantes de tubos já qualificados e dois outros em processo avançado de certificação. Há ainda dois fabricantes de conexões qualificados, além de empresas de soldagem e fabricantes de equipamentos de solda.

 

A associação prevê que a atual capacidade instalada será suficiente para atender o mercado nos primeiros três anos, mas o crescimento de demanda por tubos de pressão de pequenos e grandes diâmetros e pelos corrugados de grande diâmetro, para esgoto e drenagem, muito provavelmente puxará uma demanda adicional por máquinas para a sua produção no período posterior.

 

A ABPE tem atuado institucionalmente de forma muito forte na promoção e na divulgação das soluções de PE para aplicações em água e esgoto junto aos agentes do saneamento, sejam eles os usuários finais, projetistas ou construtoras, disseminando o seu uso e instalação correta.

 

A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), empresa de economia mista, é uma das maiores operadoras de serviços de água e esgoto do mundo, e está por trás dos bons indicadores de saneamento da região Sudeste. Há duas décadas vem utilizando os tubos de PEAD nas novas instalações e nos programas de renovação de ativos, que consistem na substituição da tubulação antiga, de ferro fundido, pela de PEAD, com vantagens como durabilidade, facilidade de instalação, maior produtividade na obra, redução do número de conexões e consequentemente menores índices de vazamento.

 

Dante Ragazzi Pauli, superintendente de planejamento integrado da Sabesp, avalia que as empresas do segmento de tubulações plásticas têm bons dias pela frente, tendo em vista que cerca de 60% do volume de investimentos previstos devem ser destinados à instalação de rede, e o restante dividido entre atividades como projeto, serviços de instalação, operação e manutenção. “Nos próximos 14 anos serão injetados mais de 20 bilhões de investimentos ao ano no setor. Quando ele for realmente alavancado, haverá grande aumento da demanda por materiais, serviços de projeto, instalação, obras, operação e manutenção das redes”.

 

As empresas se preparam

A Krona Tubos e Conexões, com duas unidades em Joinville (SC) e uma em Marechal Deodoro (AL), acompanha de perto o debate sobre o novo marco do saneamento. A empresa, uma das maiores do país no segmento, vê um importante potencial de crescimento do mercado, especialmente com a regulação do setor. “Este é um desafio enorme para o Brasil, pelo déficit de redes de esgoto e sistemas de tratamento. Ainda que não tenhamos uma atuação significativa voltada ao saneamento, estamos atentos e, conforme a ampliação deste mercado, poderemos sim incluir em nosso planejamento uma linha de produção que atenda às demandas desta área”, destacou Jorge Henrique Silva, gerente de Marketing & Customer Success.

 

A empresa destacou o gerente de engenharia da Krona, Israel Almeida Furtado, para participar da 19ª edição do World Toilet Summit, que este ano foi realizado pela primeira vez na América Latina, entre os dias 18 e 19 de novembro, em São Paulo (SP) “A necessidade de investimentos em saneamento é fundamental do ponto de vista da melhoria da qualidade de vida da população e ainda gera desenvolvimento, com o aquecimento da economia proporcionado pela inclusão de milhões de pessoas no mercado. Ou seja, todos ganham”, avaliou.

 

Para a Amanco Wavin, com sede em São Paulo (SP) e sete unidades produtivas no Brasil, as linhas de produtos para infraestrutura (distribuição de água, coleta de esgoto e água pluvial) representam cerca de 12% do faturamento do setor de tubos e conexões. José Augusto Pimentel Gomes, gerente comercial de infraestrutura da empresa considera que a aprovação do marco legal do saneamento será um estímulo importante para investimentos no setor. “O Brasil tem hoje uma grande defasagem na distribuição de água tratada e coleta, assim como no tratamento de esgoto, especialmente nas regiões Nordeste e Norte. Ainda há muito a ser feito e na velocidade que está não conseguiremos a universalização desses serviços até 2033. O país precisará de mais investimentos”, afirmou.

 

Prevendo esse aumento de demanda, a empresa já está investindo no aumento da capacidade de suas plantas industriais. “Para o sistema Biax – nova tecnologia em tubos para condução de água – estamos implantando uma terceira linha de produção. Investimos também em uma nova tecnologia para tubos de grandes diâmetros para transporte de água pluvial, o Novafort GD, e temos ainda os tubos coletores CL, com parede celular”, explicou José Augusto.

 

O executivo esclareceu que a Amanco Wavin possui enorme responsabilidade na busca pela universalização do saneamento, e por isso é uma das fundadoras do Instituto Trata Brasil (ITB), onde trabalha em parceria para a evolução do setor. Representantes da empresa também participaram do World Toilet Summit este ano.

 

Saneamento em números

Mapear a situação da demanda por saneamento é essencial para que traçar estratégias, e algumas instituições têm feito isso de forma bastante transparente. O Instituto Trata Brasil criou um portal chamado Painel Saneamento Brasil, com informações detalhadas sobre saneamento básico em 642 municípios brasileiros com população acima de 50 mil habitantes. São compilados também dados sobre os impactos sociais, econômicos e ambientais da falta deste serviço, em contraposição aos benefícios obtidos quando eles chegam à população de forma apropriada. A instituição também divulga desde 2009 o seu ranking de saneamento, cuja versão 2020 pode ser acessado e baixado aqui.
 

Já a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) publica desde 2017 o Ranking ABES da Universalização do Saneamento. A versão 2020 do estudo está disponível aqui e abrange 100% do território nacional, com dados sobre 1868 municípios e as 27 capitais que forneceram informações ao Sistema Nacional de Informações de Saneamento (SNIS). Ele correlaciona a pontuação alcançada à taxa de internação por doenças relacionadas ao saneamento inadequado.


Não perca!

A Abes vai realizar, no próximo dia 10 de junho, um webinar intitulado “O marco legal do saneamento e o novo normal”, com especialistas no mercado de saneamento discutindo o tema. As inscrições gratuitas podem ser feitas aqui.

 

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