Controle de temperatura e tratamento com plasma elevam a resistência da união entre materiais diferentes


A resistência insuficiente das uniões em peças compostas por múltiplos componentes com altos requisitos funcionais acarreta custos de desenvolvimento ou taxas de rejeição desnecessariamente altos que podem representar um ônus financeiro para as empresas. O requisito para uma união complexa e plena é uma seleção adequada do par de materiais envolvidos. Contudo, por meio de um pré-tratamento ou condução de processo adequados pode-se conseguir um nível suficiente de compatibilidade entre dois materiais que originalmente se unem entre si de maneira deficiente.


Rainer Kleeschulte e Elmar Moritzer

Data: 25/11/2016

Edição: PI Novembro 2016 Ano 19 No 219

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A moldagem por injeção de peças constituídas por múltiplos componentes já se encontra consolidada há muitos anos em numerosas aplicações e vem evoluindo cada vez mais como uma tecnologia-chave na transformação dos plásticos(1). Frequentemente as peças complexas constituídas por múltiplos componentes requerem um dispendioso trabarequerem um dislho de pré-desenvolvimento – em primeiro lugar, é necessário julgar de forma geral a viabilidade do projeto. Um dos principais problemas na fabricação de peças constituídas por múltiplos componentes é o nível insuficiente de resistência mecânica da união entre os materiais selecionados(2-4).

Este trabalho investigou algumas possibilidades uniões paraexistentes elevar a resistência numa peça das moldada por injeção constituída por dois componentes. Foram analisadas diversas geometrias de contato e o pré-tratamento de plasma atmosférico, bem como o controle dinâmico de temperatura da cavidade do molde para diversas combinações entre materiais duros.

Três variantes de produção

As investigações experimentais foram feitas de forma conjunta pela empresa Weidmüller Interface GmbH & Co. KG, com sede em Detmold, Alemanha, e pelo K-Lab da Universidade Paderborn, usando um molde para corpos de prova para tração fabricado pela gwk Gesellschaft Wärme Kältetechnik MbH, com sede em Kierspe, Alemanha. As peças foram moldadas de maneira tal que os pontos de entrada de resina fundida na cavidade do molde localizavam-se em suas duas extremidades, de forma que as frentes de resina fundida fluíssem desde as extremidades do componente até sua região central. A resina fundida foi conduzida até o molde através de um distribuidor com canais frios.

Fig. 1 – Representação esquemática de inserto para molde com elementos cerâmicos com alta capacidade de aquecimento e refrigeração próxima aos contornos5(foto fornecida pelo K-Lab)

Uma particularidade do molde, que também foi usada durante a investigação sobre as características das linhas de soldagem, é a presença de elementos cerâmicos para aquecimento situados próximo à cavidade no lado dos bocais e do extrator, os quais possibilitam um controle dinâmico local de temperatura do molde sob densidades de fluxo de calor de até 150 W/cm2. Por conta da refrigeração adicional próximo da cavidade do molde pode-se, dessa forma, alcançar rampas de temperatura de até 25 °C/s (figura 1). O sistema de controle de temperatura com múltiplos laços comunica-se com a injetora utilizada (modelo KM 160/750 CX DUR, fabricada pela KraussMaffei Technologies GmbH, de Munique, Alemanha) por meio de uma interface com barramento fabricada pela Varan.

As investigações experimentais efetuadas foram subdivididas em três categorias. Os corpos de prova foram confeccionados com:

Dispunha-se de um equipamento para tratamento de plasma atmosférico para a última variante de manufatura, o qual havia sido fabricado pela Plasmatreat GmbH, sediada em Steinhagen, Alemanha.

Ajustando o sistema de transferência durante o experimento

Para obter conclusões sobre a eficácia dos processos isolados foram primeiramente confeccionadas metades de corpos de prova de tração nas instalações laboratoriais da Weidmüller Interface. Tão logo essas metades de corpos de prova eram dispostas no molde, a resina fundida relativa ao componente sobremoldado era conduzida sobre o volume livre remanescente. Dessa forma se dispunha de corpos de prova constituídos por dois componentes, no mesmo estilo correspondente ao sistema de transferência ou remanejamento (figura 2). Dessa forma o controle dinâmico de temperatura atuou sobre a interface entre a pré-forma e o segundo componente.

Fig. 2 Corpo de prova para ensaio de tração: à esquerda está mostrada a pré-forma, enquanto à direita se encontra a peça sobremoldade por injeção composta pos dois componentes

Para investigar os mecanismos de união atuantes sob influência dos diversos processos de fabricação foram estudadas múltiplas combinações de materiais, tanto originariamente compatíveis como também incompatíveis. A seguir são apresentados os resultados para três diferentes combinações de materiais (tabela 1). A prioridade para este estudo foi um grau de PA 6.6 (Wellamid 6600 HWV0CP, fabricado pela CP-Polymer-Technik GmbH & Co. KG, com sede em Ritterhude, Alemanha) e outro de PBT (grau Pocan KU 27503/1, fabricado pela Lanxess Deutschland GmbH, de Colônia, Alemanha).

Além disso, foi analisada uma possível influência da geometria de contato; para tanto, foram confeccionadas pré-formas moldadas por injeção com quatro diferentes geometrias de união (figura 3):

Numa primeira etapa foi determinada a adequação das quatro variantes geométricas, bem como a influência dos parâmetros de processo, particularmente a duração e intensidade do controle dinâmico de temperatura, para duas combinações de materiais. Para tanto foi concebida uma série de ensaios com auxílio de ferramentas estatísticas para planejamento de experimentos. Foram incluídos nesse estudo preliminar, para algumas variantes geométricas selecionadas, experimentos envolvendo o controle dinâmico de temperatura na cavidade do molde.

Após a análise dos resultados – tendo sido tomada como referência para a resistência da união a força máxima necessária para romper o corpo de prova – pôde-se determinar os parâmetros otimizados de processo e estabelecer as premissas para o potencial de otimização do aquecimento dinâmico do molde (DMH). A partir desses parâmetros de processo foi possível, na última etapa deste experimento, confeccionar peças constituídas por dois componentes sem usar o sistema para controle de temperatura com o aquecimento dinâmico do molde (DMH), já que suas pré-formas foram previamente tratadas com plasma atmosférico. Esta configuração permite uma comparação entre as variantes de processamento convencional, com controle dinâmico de tem-peratura na cavidade do molde e compré-tratamento de plasma.

Geometrias inadequadas na superfície de união

Fig. 3 – Valores médios da força de tração necessária para a fratura de corpos de prova constituídos de PBT/PBT (resistência teórica do material-base igual a aproximadamente 1.200 N, conforme o catálogo): tanto a geometria da superfície de união, como a duração e intensidade do controle dinâmico de temperatura influenciam a carga máxima necessária para a fratura do corpo de prova

O exemplo da combinação entre materiais PBT/PBT deixou claro que tanto a geometria da superfície de união, como também a duração e intensidade do resfriamento dinâmico do molde, influenciaram de forma significativa a força máxima necessária para o rompimento do corpo de prova. Foi mostrado que sobretudo a geometria de dentes de serra levou a valores de resistência muito baixos.

Foi constatado que na região dos dentes, por um lado, ocorre turbulência da resina fundida e, por outro, ocorre um efeito de entalhe na região das pontas. A fusão das pontas igualmente não exerceu nenhuma influência positiva sobre a união, como um possível “agarramento” entre os recessos existentes. A geometria de bigorna (figura 3, à direita), apesar de ter apresentado resistência mecânica suficientemente alta, mostrou a desvantagem de, na maioria dos casos, não ter garantido o preenchimento pleno da cavidade, uma vez que o material se tornou plástico devido à influência do elemento cerâmico de aquecimento, fazendo com que a bigorna se deformasse quando a resina fundida correspondente ao segundo componente entrou em contato com ela. Dessa forma, não se conseguiu uma união plena entre os materiais. Os resultados globais mostraram que a resistência mecânica se elevou significativamente, de forma independente da geometria, quando se elevou a temperatura na superfície de união.

A partir desses resultados as investigações adicionais foram restritas às variantes geométricas restantes, ou seja, “em forma de L” e cunha. Além da temperatura do elemento cerâmico e do tempo de aquecimento, também ocorreram variações na magnitude e no tempo de aplicação da pressão de compactação. A temperatura do molde foi mantida constante para se destacar a influência do aquecimento dinâmico independente proporcionado pelo elemento cerâmico.

O controle dinâmico de temperatura duplicou a resistência mecânica da união

Foi demonstrado que, na melhor das hipóteses, a pressão de compactação influenciou de forma secundária a resistência da união. A tendência aqui constatada, como também foi verificado para outros pares de materiais e variantes geométricas, foi a existência de uma influência negativa por parte de tempos mais longos de aquecimento durante o controle de temperatura dinâmico da cavidade do molde (DMH). Finalmente, ao se comparar a resistência de cada combinação de materiais submetidos a parâmetros otimizados de processo, pode-se constatar claramente uma grande diferença entre o controle de temperatura convencional e o resfriamento dinâmico da cavidade do molde.

Fig. 4 – Comparação entre a resistência da união entre os componentes (à esquerda e no centro: geometria de cunha; à direita: em forma de ‘L’): o efeito do controle de temperatura dinâmico em comparação com o convencional é visível

No caso da combinação de materiais PBT/PBT quase ocorreu duplicação da força máxima necessária para a ruptura dos corpos de prova. Também para a combinação de materiais de ambos os graus de PA 6.6 ocorreu uma elevação da resistência mecânica em torno de 20% sobre o valor obtido usando o processo convencional. Ao utilizar a “geometria em L” para esta combinação de materiais igualmente se observou quase uma duplicação dos valores de resistência mecânica (figura 4).

Outras combinações de materiais também estudadas, como PA 6.6/ PA 6.6-GF30 (esta última resina reforçada com 30% de fibras de vidro), PA 6.6+6/PA 6.6 e PA 6.6+6/ PA 6.6+6, também apresentaram resultados similares. Pode-se concluir a partir daí que o controle dinâmico da temperatura na cavidade do molde elevou de forma significativa a resistência do corpo de prova constituído por um par de componentes duros. Além disso, o aporte de energia foi significativamente menor, uma vez que não é necessário aquecer todo o molde, mas sim apenas uma pequena massa dele. O prolongamento do tempo de ciclo decorrente do aquecimento adicional proporcionado pelo elemento cerâmico foi pequeno nos casos aqui expostos, tendo em vista que curtos tempos de aquecimento melhoraram os resultados. Se for necessário alcançar valores de resistência comparativamente altos usando um molde com maior nível de controle de temperatura (portanto, sem aquecimento dinâmico do molde – DMH), também aqui ocorre um prolongamento similar do tempo de ciclo em função de uma fase de resfriamento mais longa.

Materiais incompatíveis podem ser unidos após o tratamento a plasma

Uma alternativa para elevar a resistência de uma peça constituída por dois componentes consiste no tratamento das pré-formas com plasma atmosférico. Esse processo oferece a vantagem, em comparação a outras alternativas, de trabalhar sob pressão atmosférica e usar apenas ar como gás de processo. Ele consiste em um feixe de plasma isento de potencial que sai do lado do bocal, sendo então defletido e atingindo o substrato de forma uniforme por meio de sua rotação sobre o eixo central. Isto ocorre com auxílio da aplicação de um fluxo de ar. O tratamento isento de potencial permite que mesmo materiais sensíveis, como plásticos, possam ser pré-tratados de maneira efetiva.

Fig. 5 – Comparação entre o processamento convencional, controle de temperatura com aquecimento dinâmico do molde (DMH) e pré-tratamento com plasma, tomando como exemplo as combinações de materiais PBT/ PBT (à esquerda) e PA 6.6/PA 6.6 (à direita). Ficou demonstrado que os elementos cerâmicos para aquecimento dinâmico exerceram influência máxima sobre a resistência da união entre os componentes (geometria em cunha)

Nestes ensaios as superfícies das pré-formas moldadas por injeção foram tratadas com plasma; os parâmetros desse processo – distância entre o bocal de plasma até o substrato e a velocidade de deslocamento do bocal – foram previamente determinados. Os corpos de prova confeccionados foram a seguir introduzidos no molde e processados, sendo obtidas peças compostas por dois materiais usando sistema convencional para controle de temperatura no molde. A comparação entre o processamento convencional, controle de temperatura com aquecimento dinâmico do molde e pré-tratamento com plasma revelou que a modificação da superfície com plasma em materiais polares similares (PA 6.6/PA 6.6) não promoveu nenhuma melhoria especial em comparação com o processo convencional sem pré-tratamento com plasma. Por sua vez, no caso de combinações de materiais apolares, como PBT, ficou comprovada uma elevação da resistência mecânica entre aproximadamente 60 e 70% (figura 5). Em ambos os casos, a resistência mecânica ficou substancialmente abaixo dos valores conseguidos ao se utilizar o controle dinâmico de temperatura.

Estudos posteriores com PA 6.6/PBT deixaram novamente evidente o significado do pré-tratamento com plasma para uma combinação originariamente incompatível entre um material polar e outro apolar. Conforme os resultados das medições efetuadas, sob parâmetros otimizados do processo de pré-tratamento com plasma (vplasma igual a 17 mm/s e aplasma igual a 8 mm), foram necessários valores de força da ordem de 80 N para promover a ruptura dos corpos de prova (figura 6). Também puderam ser obtidos valores suficientemente altos de resistência à fratura na união entre PBT e PA 6.6, materiais que, em função das diferentes tensões superficiais, geralmente apresentam união muito difícil entre si.

Conclusões

Fig. 6 – Força de tração alcançada no momento da fratura do corpo de prova e valores de resistência de união entre os componentes (geometria em cunha) tomando como exemplo o par de materias PBT/PA 6.6: sob parâmetros otimizados do processo de pré-tratamento de plasma podem ser unidos mesmo pares de materias supostamente incompatíves. A barra vermelha permite uma comparação com os valores alcançáveis ao se utilizar parâmetros de processos médios(7)

A modificação de um processo de moldagem por injeção de peças constituídas por dois componentes permite aumentar a resistência da união entre eles. Por exemplo, o controle dinâmico da temperatura na cavidade do molde permite, mediante baixo consumo de energia, uma limitada elevação local do nível de temperatura na região da interface superficial de uma peça constituída por dois componentes. O resultado é um significativo aumento da resistência da união entre os componentes. Conforme o par de material utilizado, podese conseguir uma elevação de aproximadamente 100% em comparação com o processo convencional. A utilização de um pré-tratamento com plasma mostrou-se útil, sobretudo no caso de pares de materiais que apresentam tensões superficiais fortemente diferentes. Dessa forma o transformador de resinas pode conseguir níveis de resistência suficientemente altos na união entre os componentes da peça, mesmo no caso de combinações de materiais originalmente incompatíveis.

Agradecimentos

Os autores agradecem às três empresas que participaram de forma decisiva desta investigação:

– gwk Gesellsschaft Wärme Kältetechnik mbH, de Kierspe, Alemanha, pela confecção dos ferramental e do “integrat evolution”, um sistema de controle de temperatura com múltiplos laços;

– Plasmatreat GmbH, de Steinhagen, Alemanha, pela fabricação do sistema para tratamento por plasma atmosférico;

– Weidmüller Interface GmbH & Co. KG, de Detmold, Alemanha, pelo fornecimento de materiais e pela fabricação e tratamento por plasma das pré-formas moldadas por injeção.