Desligamento de emergência de geradores FV


Dados estatísticos e a experiência de combate a incêndio demonstram que sistemas fotovoltaicos convencionais, mesmo em situações de emergência, não representam riscos adicionais. Os requisitos de segurança são analisados neste artigo à luz das normas técnicas, ensaios e pesquisas de campo.


C. Merz, G. Bettenwort, M. Hopf, H. Knopf e J. Laschinski, da SMA Solar Technology AG (Alemanha)

Data: 10/09/2017

Edição: Fotovolt Setembro 2017 - Ano 3 - No 12

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A filosofia de segurança de instalações fotovoltaicas (FV) evoluiu nos últimos 30 anos.

Com o avanço da tecnologia, surgiram elementos preventivos de segurança tanto para proteção dos equipamentos quanto das pessoas, tais como isolação dupla, supervisão de corrente de fuga e detecção de faltas a arco. Especialmente nos últimos anos, foram elaborados requisitos normativos para desligamento de emergência de geradores FV (rapid shutdown) no nível dos strings (séries fotovoltaicas). Em resposta a essas exigências, foram lançadas múltiplas soluções técnicas de diversos fabricantes. Entretanto, ao contrário da intenção original, em certos casos algumas dessas soluções causaram incêndios ao invés de evitá‑los [1]. Isto demonstra que a inserção de elementos individuais de segurança não necessariamente conduz a um aumento de segurança da instalação como um todo.

Nos Estados Unidos, o NEC 2017 [2] elevou os requisitos de segurança das instalações. Entre as muitas soluções, está implicitamente prescrita a utilização de dispositivos eletrônicos adjacentes aos módulos FV (Panel Level Electronics, PLE), constituindo unidaDados estatísticos e a experiência de combate a incêndio demonstram que sistemas fotovoltaicos convencionais, mesmo em situações de emergência, não representam riscos adicionais. Os requisitos de segurança são analisados neste artigo à luz das normas técnicas, ensaios e pesquisas de campo. des de desligamento. Essa prescrição aumenta enormemente a quantidade de elementos de interrupção de corrente nos painéis FV. Neste artigo são discutidas as consequências desse procedimento sobre a confiabilidade e a disponibilidade dos geradores fotovoltaicos e, por extensão, sobre o sistema de fornecimento de energia. São também apresentadas alternativas ao desligamento junto aos módulos, que emergiram como soluções no mercado alemão e europeu.

Requisitos normativos

Na recente edição do NEC 2017 (National Electrical Code), está implicitamente exigido o desligamento do gerador FV no nível dos módulos como uma possível opção. A figura 1 mostra os requisitos importantes com os respectivos limites de tensão, tempos e limites geométricos.

O requisito mais importante é que a tensão no gerador FV seja limitada em caso de emergência a 80 V, que na prática equivale à tensão de um único módulo. Essa prescrição significa que um dispositivo eletrônico (PLE) é necessário junto ao módulo FV ou na caixa de conexão do módulo. No NEC 2017 são, porém, indicadas duas alternativas:

Enquanto aquela primeira medida ainda demanda esclarecimentos mais exatos das comissões de normas, a segunda se refere a um tipo de execução com módulos especiais para instalação sobre telhados (Dachschindelmodule, em alemão). Se forem utilizados somente módulos desse tipo, suficientemente afastados de partes aterradas, as exigências do NEC 2017, Seção 690.12 (B) (2), estão satisfeitas sem necessidade de interruptores nos módulos.

Na Alemanha inexiste até o momento uma norma comparável ao NEC 2017. Contudo, o Guia de Aplicação VDE-AR-E 2100-712 [4] contém recomendações para minimizar o risco de choques elétricos para as equipes de intervenção dos bombeiros durante o combate a incêndio num gerador FV. Caso o referido guia tenha sido prescrito pelo projetista da edificação ou da instalação, devem ser implementadas uma ou mais medidas conforme tabela I. A identificação da instalação deve ser sempre executada.

As alternativas para o desligamento do módulo constantes do NEC 2017, bem como as medidas abrangentes do guia publicado pela VDE, demonstram que há múltiplas medidas preventivas à disposição para proteger as equipes de combate a incêndio em geradores FV, cuja eficácia não se baseia na eletrônica dos módulos. Para que se possa avaliar futuras medidas supostamente destinadas a aumentar a segurança, é necessário examiná-las em instalações já existentes, como detalhado a seguir.

Fig. 1 – Limites de tensão, tempos de desligamento e distâncias conforme NEC 2017 [3]

Segurança de instalações FV existentes

O principal argumento para o recente aumento do rigor das normas é a proteção dos profissionais contra elevadas tensões das séries fotovoltaicas durante o combate a incêndio. Todavia, esse perigo potencial não pode ser identificado em nenhuma das estatísticas publicadas até o presente, que se ocupam da segurança em instalações FV. De acordo com um estudo do Instituto Fraunhofer ISE [5], especializado em energia solar, as estatísticas de incêndio e vítimas relacionadas à fotovoltaica nos últimos 20 anos indicam que somente 0,006% das instalações FV na Alemanha causaram incêndios com danos severos. Além disso, não se conhece nesse período nem um único caso de bombeiro que tenha se acidentado com tensão muito alta durante uma operação de combate ao fogo. Esses dados são ainda mais significativos quando se considera que na Alemanha o desligamento de emergência no nível dos módulos FV não é prática corrente.

A estrita aplicação de métodos consagrados de combate a incêndio em instalações elétricas parece ser um modo eficiente de proteger as equipes de intervenção também no âmbito das instalações fotovoltaicas. Essa afirmação é confirmada por uma pesquisa do TÜV-Rheinland e do Instituto Fraunhofer ISE [6], que constatou ser seguro o trabalho dos bombeiros quando observadas determinadas distâncias mínimas (conforme tabela II) entre o esguicho e a instalação elétrica durante o combate ao fogo.

Os exemplos e estatísticas citados indicam que geradores FV clássicos, construídos conforme a tecnologia de strings, mesmo em situações de emergência não representam perigo adicional nem extraordinário.

No entanto, nos últimos anos, alguns fabricantes lançaram chaves seccionadoras de corrente contínua com o objetivo de atender aos requisitos do NEC 2014, ou de outras normas nacionais, referentes ao desligamento de emergência dos módulos no nível dos strings. Alguns desses produtos não estavam à altura das solicitações no local de instalação e precisaram ser devolvidos, porque eles próprios foram causa de incêndio em vez de tornar o gerador FV mais seguro [1].

O desligamento de emergência de um gerador FV por meio de eletrônica junto aos módulos (PLE) aumenta substancialmente o número de componentes em comparação com a tecnologia convencional de strings. Isto requer uma análise minuciosa das condições de operação e das falhas do sistema, de modo a poder estimar a influência da PLE sobre a segurança do gerador FV.

Condições de operação e falhas do sistema

Um projeto de pesquisa e desenvolvimento denominado PV-Firebreaker [7], conduzido pelo TÜV‑Rheinland, definiu e analisou as condições de operação e as falhas do sistema em instalações FV com strings e com a eletrônica PLE nos módulos. Esses parâmetros estão listados na tabela III.

Em consequência das falhas do sistema consideradas, a PLE ou a respectiva fonte de alimentação podem ser danificadas. Portanto, é importante que nesses casos a PLE possa comutar automaticamente para um estado em que a tensão de saída continue limitada a 80 V, de acordo com o NEC 2017.

Já os riscos potenciais resultantes das condições de operação são geralmente subestimados na prática. Por exemplo, correntes de retorno podem fluir durante longo tempo durante o dia. A intensidade da corrente de retorno pode atingir o dobro da corrente de curto‑circuito do módulo FV. Os componentes internos da PLE devem obviamente suportar essas correntes de retorno.

Na sequência, são analisadas as condições de operação “correntes de manobra capacitivas” e “operações de manobra assíncronas”. A figura 2 mostra as correntes de manobra capacitivas que podem ocorrer num sistema FV. Trata‑se de um sistema simplificado composto de um módulo FV, uma chave multipolar que secciona o módulo, e um inversor.

No início, a chave multipolar está aberta e a capacitância de entrada do inversor está descarregada. O módulo FV encontra‑se, portanto, operando em vazio, mas também apresenta uma capacitância parasita, que pode alcançar valores superiores a 1 mF (conforme medições da SMA). Quando a chave é fechada, a capacitância carregada do módulo é aplicada sobre a capacitância descarregada na entrada do inversor, fato que pode originar correntes de manobra superiores a 1 kA.

Fig. 2 – Correntes de manobra capacitivas [7]

A problemática das manobras assíncronas está representada na figura 3, que mostra um string com três módufalhas do sistema típicas de instalações los FV, cada um com um dispositivo FV. Nas normas nacionais e internade manobra adjacente, além de um cionais sobre dispositivos de manobra, inversor. Por razões econômicas, é os desafios específicos da energia fotorazoável que cada uma dessas chavoltaica, comentados na seção anterior, ves seja dimensionada para a tensão infelizmente não são contemplados. Por máxima prevista para o módulo FV. isso foram desenvolvidos critérios de Contudo, se a manobra das chaves teste no projeto PV-Firebreaker. Numa ocorrer defasada no tempo (por exempróxima etapa, as normas existentes deplo, devido a uma perturbação no vem ser complementadas com os conhesinal que comanda o desligamento), cimentos adquiridos e novos critérios a tensão aplicada a uma única chave de ensaio. É tarefa para as respectivas pode ser significativamente mais alta. comissões de norma. No exemplo em análise, a chave 1 fecha no instante t1, enquanto as chaves 2 e 3 já haviam fechado previamente Confiabilidade no instante t2. Logo, a chave 1 fica sube disponibilidade metida, até o fechamento completo, ao As energias renováveis já alcançatriplo da tensão do módulo, ou seja, ram um lugar de destaque no suprimenà tensão total do string. Esse fenômeno pode provocar um arco com a consequente destruição da chave. Portanto, é necessário neste caso dimensionar adequadamente as chaves, ou adotar um esquema de proteção.

Fig. 3 – Operações de manobra assíncronas das chaves dos módulos [7]

Fig. 4 – Curva característica da taxa de falha de um sistema técnico ao longo da vida útil

Esses exemplos demonstram que a PLE deve considerar uma série de condições operacionais e falhas do sistema típicas de instalações FV. Nas normas nacionais e internacionais sobre dispositivos de manobra, os desafios específicos da energia fotovoltaica, comentados na seção anterior, infelizmente não são contemplados. Por isso foram desenvolvidos critérios de teste no projeto PV-Firebreaker. Numa próxima etapa, as normas existentes devem ser complementadas com os conhecimentos adquiridos e novos critérios de ensaio. É tarefa para as respectivas comissões de norma.

Confiabilidade e disponibilidade

As energias renováveis já alcançaram um lugar de destaque no suprimento de energia, pelo menos em alguns países. Segundo dados da BSW-Solar (German Solar Association) [8], a potência de energia solar FV instalada mundialmente até o fim de 2016 superava os 300 GWp. É evidente que a fotovoltaica será parte fundamental da matriz energética no futuro.

A fim de garantir a disponibilidade futura da energia elétrica, a confiabilidade de todos os componentes deve ser comparável à das usinas geradoras convencionais. Para um gerador FV, isto significa que cada componente individual deve satisfazer metas de confiabilidade e de vida útil. A confiabilidade de sistemas técnicos é geralmente expressa em taxas de falha. As taxas de falha ao longo da vida útil operacional seguem a curva típica reproduzida na figura 4, na qual se podem distinguir essencialmente três fases:

Em geral, o objetivo das atividades de desenvolvimento é evitar tanto quanto possível a fase de falhas prematuras, mediante processos produtivos de alta qualidade, e descobrir defeitos por meio de testes antes do fornecimento do produto. Já o aumento da taxa de falhas devido a mecanismos de desgaste deveria ocorrer, se possível, somente após o tempo de vida útil planejado, mediante o dimensionamento adequado dos componentes. A vida útil efetiva (useful life, em inglês; Betriebsdauer, em alemão, neste contexto) situa-se na fase de taxas de falha aproximadamente estabilizadas e é, para a maioria dos sistemas técnicos, a fase de mais longa duração.

Na fase de vida útil efetiva é possível determinar os parâmetros utilizados para análise quantitativa da confiabilidade. O parâmetro MTBF (Mean Time Between Failure) designa o tempo médio entre duas falhas e é definido como o inverso da taxa de falha constante:

Outro parâmetro é o FIT-Rate (FIT = Failures in Time), que usualmente indica a taxa de falha a cada 109 horas de operação. O FIT-Rate é dado pela expressão:

Portanto, a taxa de falha de componentes eletrônicos pode ser determinada objetivamente. Essa taxa vale, porém, exclusivamente para as condições de operação consideradas, dentre as quais a temperatura ambiente é a principal. Em pesquisas realizadas pela SMA, a temperatura ambiente dos módulos FV foi analisada em mais de 550 localidades com o emprego do Sunny Sensorbox, que mede a irradiação e a temperatura da célula. Para diminuir a complexidade, a partir do conjunto de dados medidos foi definido um perfil (Mission Profile) simplificado e representativo. Com esses elementos é possível elaborar histogramas que expressam o volume de horas de operação sob determinadas temperaturas. Os histogramas, por seu turno, servem para calcular as taxas FIT de certos componentes críticos.

Fig. 5 – Comparação das taxas FIT calculadas de todas as localidades analisadas com o Mission Profile

A figura 5 mostra as taxas FIT de mais de 550 localidades comparadas com o Mission Profile representativo. De um lado constata‑se que esse perfil cobre mais de 98% das localidades observadas. De outro, a comparação indica que as taxas FIT dependem fortemente de influências locais, por exemplo, da orientação e da ventilação posterior do gerador FV.

A figura 6 compara as horas de operação sob alta temperatura do Mission Profile e de outras localidades analisadas com os dados meteorológicos do software Meteonorm [9] e com os do setor automotivo. Verifica‑se que os esforços térmicos sob o módulo FV equivalem perfeitamente aos do setor automotivo.

A pesquisa realizada enfatiza que o efeito da temperatura dos componentes do módulo FV não pode ser subestimado. Ele é comparável aos esforços térmicos das aplicações no setor automotivo, geralmente classificadas como muito exigentes. Para atingir as metas de confiabilidade e vida útil, apesar do nível de exigências, há alguns fatores‑chave para o design e aplicação da eletrônica adjacente aos módulos fotovoltaicos (PLE). A PLE deve ser suficientemente dimensionada e demonstrar maturidade técnica. Este requisito decorre das condições operacionais severas e das falhas do sistema discutidas anteriormente. Além disso, devem ser implementados mecanismos que evitem disparos falsos. É indispensável que os requisitos específicos da fotovoltaica sejam considerados na fase de projeto, de modo a possibilitar uma operação confiável.

Fig. 6 – Comparação das horas de operação sob temperatura elevada em diversas localidades (calculada com dados da Meteonorm [9])

Uma pequena quantidade de componentes proporciona uma taxa de falha potencial correspondentemente mais baixa para o sistema como um todo. Isso pode ser conseguido construindo um sistema modular e sob medida para os requisitos específicos da PLE. Por exemplo, uma simples chave para manobra do módulo não precisa incorporar necessariamente as funções adicionais de otimizador de potência (Power Optimizer).

Outra vantagem resulta da aplicação orientada para os objetivos da PLE. Um exemplo está ilustrado na figura 7. A PLE (neste caso, um otimizador de potência) é instalada apenas nos módulos realmente sujeitos a sombreamento. É o caso típico de telhados com mansardas de janelas ou antenas parabólicas, que sombreiam sempre as mesmas partes do gerador FV.

Finalmente, um alto grau de confiabilidade também pode ser alcançado quando os componentes ativos da PLE permanecem desativados a maior parte do tempo. Otimizadores de potência com topologia do tipo step-down somente devem atuar quando o respectivo módulo FV estiver sombreado e outras partes da série fotovoltaica estiverem plenamente irradiadas. Se o string volta a receber irradiação homogênea, todos os otimizadores de potência desse string se tornam inativos. Este procedimento reduz as perdas ao mínimo.

Conclusão

Fig. 7 – Aplicação típica de PLE em condições de sombreamento

A experiência de mais de 20 anos [5] na operação de instalações FV de geração distribuída indica que sistemas FV construídos com tecnologia convencional de strings, mesmo em condições de emergência, não representam perigo adicional ou extraordinário. A estrita observância de métodos consagrados de combate a incêndio permite o trabalho seguro da equipe dos bombeiros.

As normas atuais muitas vezes não consideram as condições de operação e as falhas de sistema específicas que podem ocorrer em instalações FV. A eletrônica dos módulos deve atender a essas condições de modo adequado, a fim de conseguir uma operação segura e confiável.

Com base nas mencionadas condições de operação e falhas de sistema foram definidos critérios de ensaio [7]. Estes devem ser integrados às futuras normas para assegurar que somente PLEs seguros e confiáveis sejam comercializados.

A eletrônica PLE deve ser suficientemente dimensionada e demonstrar maturidade técnica, conter o menor número possível de componentes, e reduzir as perdas a um mínimo, para atingir os objetivos de confiabilidade e vida útil.

Referências

  1. [1] NSW: Recall of Solar Isolators, Australian Competition & Consumer Commission, https://www.productsafety.gov.au (20.05.2014).
  2. [2] National Fire Protection Association (NFPA): National Electrical Code Handbook; 14th Edition 2017.
  3. [3] Evaluating the Case for Module‐Level Shutdown, SMA Solar Technology AG (2015).
  4. [4] VDE‐AR‐E 2100‐712:2013‐05, Maßnahmen für den DC‐Bereich einer Photovoltaikanlage zum Einhalten der elektrischen Sicherheit im Falle einer Brandbekämpfung oder einer technischen Hilfeleistung.
  5. [5] Recent Facts about Photovoltaics in Germany, Fraunhofer ISE (2015).
  6. [6] Bewertung des Brandrisikos in Photovoltaik‐Anlagen und Erstellung von Sicherheitskonzepten zur Risikominimierung, TÜV Rheinland, Fraunhofer ISE (2015).
  7. [7] “PV‐Firebreaker” final report (FKZ 0325596), TÜV Rheinland et. al. (2016).
  8. [8] Photovoltaik‐Meilenstein: Weltweit 300 Gigawatt installiert, Pressemitteilung des BSW‐Solar (25.01.2017).
  9. [9] Software “Meteonorm V6.0”, Meteotest, http://www.meteotest.ch.