Gestão do consumo em instalações nos períodos de inatividade


O consumo no período inativo das instalações costuma ser negligenciado por ser reduzido. Todavia, ele oferece oportunidades para melhoria de desempenho. Por isso, é necessário realizar uma gestão energética rigorosa desses intervalos. Este artigo trata da segmentação horária, considerada uma ferramenta adequada para análise de uso e consumo de energia nos períodos de inatividade ou de atividade reduzida.


Guilherme Filippo, Unesp/Guaratinguetá

Data: 31/05/2017

Edição: EM Abril 2017 - Ano - 45 No 517

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O uso e o consumo de energia variam de acordo com as atividades ou a produção das organizações. No entando, muitas instalações apresentam consumo de energia nos períodos sem atividades — normalmente madrugadas, finais de semanas, feriados ou outros intervalos temporais. Por outro lado, algumas edificações que operam no regime 24/7 (vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana) não possuem intervalos de inatividade, embora possam apresentar redução significativa das atividades em certos momentos. Em geral, a relação entre consumo e nível de atividades é linear, como representado na figura 1.

A norma ABNT NBR ISO 50.006:2016 Sistemas de gestão de energia Medição de desempenho energético utilizando linha de base energética (LBE) e indicadores de desempenho energético (IDE) define como carga de base o uso ou consumo de energia para o caso de nível nulo de atividades. Porém, a experiência mostra que a carga de base pode não ser exatamente constante. Existem casos em que esse fator tem variação sazonal, especialmente quando cargas de refrigeração estão envolvidas. Vale destacar que o consumo específico (CE), isto é, a relação entre o consumo de energia e o nível de atividade (produção, vendas, homens-hora, etc.), aumenta exponencialmente com a redução da atividade, conforme mostra a figura 2.

Fig. 1 – Indicadores de desempenho energético (IDE) atividades

Fig. 2 – Consumo específico CE atividades

Em geral, o consumo no período inativo costuma ser negligenciado, por ser reduzido. Todavia, ele oferece oportunidades para melhoria de desempenho. Por isso, é necessário realizar uma gestão energética rigorosa para os períodos de inatividade ou de atividade reduzida.

A segmentação horária é a ferramenta mais adequada para análise de uso e consumo de energia nesses intervalos. Basicamente, trata-se de mensurar e caracterizar o consumo visando obter respostas para as seguintes questões: Quais são os usos significativos de energia? Quais são os fatores que influenciam esses usos e consumos? Qual o comportamento da energia ao longo de intervalos de tempo?

Fig. 3 – Histórico de consumo e demanda

Os usos mais significativos de energia nos intervalos de atividade nula ou reduzida variam com a natureza e finalidade da instalação. Para edifícios comerciais e de serviços, os mais frequentes são: iluminação (interna e externa), refrigeração e sistemas de computação (microcomputadores em stand-by, servidores, roteadores, etc.). Já para instalações industriais, geralmente os usos mais significativos residem nas utilidades: ar comprimido, produção e circulação de água gelada, fria ou quente e fluido térmico, sistemas de bombeamento, etc.

A instalação

Para discorrer sobre a segmentação horária como ferramenta para análise de uso e consumo de energia nos períodos de inatividade ou atividade reduzida, foi selecionado um campus universitário com área construída de cerca de 27 mil m2, localizado em um terreno de 160 mil m2. O local possui uma única medição junto ao ponto de fornecimento na cabine principal e outras cinco estações transformadoras, cuja capacidade total de transformação é de 1600 kVA. A instalação é enquadrada no subgrupo A4.

As estimativas de consumo das cargas mais relevantes são:

Vale lembrar que existe ainda uma miríade de outras cargas, como: geladeiras, freezers, bebedouros, bombas, equipamentos, máquinas e aparelhos de laboratórios e oficinas.

Para aplicação da ferramenta mencionada, foram medidos e registrados durante quatro anos, de janeiro de 2012 a dezembro de 2015 (totalizando 48 meses), os seguintes dados: consumo fora de ponta indutivo (CFPi), consumo fora de ponta capacitivo (CFPc), consumo de ponta (CP), demanda fora de ponta indutivo (DFPi), demanda fora de ponta capacitivo (DFPc) e demanda de ponta (DP).

A partir da figura 3, que mostra os gráficos desses históricos, pode-se observar claramente a característica sazonal dos consumos e das demandas fora de ponta indutivo (verde) e ponta (azul). A sazonalidade é ditada pela combinação do ciclo verão/inverno e pelo calendário escolar (férias escolares do final de dezembro ao início de fevereiro). Consumo e demanda fora de ponta capacitivo (vermelho) se apresentam de forma estável. O período fora de ponta capacitivo ocorre na madrugada (0–6 h), quando o campus está totalmente sem atividades.

Segmentação horária

A participação relativa dos consumos totalizados em 48 meses é de: CFPi, 69,5%; CFPc, 19,3%; e CP, 11,2%. O consumo no período inativo é ainda maior que o indicado, pois no período noturno (18–24 h) dos sábados, domingos, feriados e férias escolares o campus não tem expediente. Assim, esses períodos se somam aos das madrugadas, haja vista que o perfil de consumo é o mesmo. Tendo em conta esse período estendido de inatividade, a participação do consumo aumenta para 26% do total do campus. O consumo diurno nos domingos e feriados não foi considerado, tornando esta estimativa conservadora.

Fig. 4 – Fator de carga na madrugada (0–6 h)

O perfil de consumo nas madrugadas não apresenta qualquer viés de sazonalidade. O gráfico da figura 4 mostra o fator de carga ao longo de 48 meses. Observa-se um FC elevado para o intervalo.

O principal uso de energia no período noturno sem atividades é a iluminação externa (IE). Com potência instalada de 70 kW e 4100 horas anuais de operação, a IE responde por cerca de 20% do consumo total da instalação. Considerando 2190 horas para as madrugadas e 700 horas para as noites sem atividades, o consumo da IE totaliza 56% do consumo nos períodos sem atividades. Esse montante representa 14,5% do consumo total da instalação, o que é um valor consideravelmente elevado.

Mediante separação de circuitos e utilização de programadores horários, é possível reduzir a potência da iluminação externa para cerca de 24 kW nas madrugadas. Isso implica o desligamento de 140 pontos de luz dos 200 existentes, deixando em operação apenas o necessário para garantir condições mínimas de segurança interna do campus.

A demanda média no período da madrugada é de 150 kW, sendo 70 kW para iluminação externa. As outras cargas presentes nos períodos de inatividade são: equipamentos de computação (servidoras, hubs, microcomputadores em stand-by, etc.) e eventuais condicionadores de ar associados, bombas d’água, equipamentos de refrigeração (geladeiras e freezers) e iluminação interna residual. Também existe a contribuição das perdas a vazio dos transformadores da instalação.

Conclusão

Para a instalação analisada, a iluminação externa (IE) representa o uso mais significativo de energia nos períodos de inatividade.

Através da ferramenta apresentada, foi possível estimar que 26% do consumo da instalação ocorre nos períodos de inatividade. A iluminação externa responde por 56% desse consumo. Embora com potência instalada de 70 kW, a IE é responsável por 20% do consumo total da instalação, sendo que 14,5% ocorre nos períodos de inatividade (11% nas madrugadas).

É possível reduzir parte desse consumo com medidas muito simples, como o desligamento parcial da iluminação externa nas madrugadas, resultando numa economia de cerca de 7% do consumo total da instalação. Para esse desenvolvimento, bastou o processamento do histórico de faturamento da instalação.