Influência dos parâmetros de corte no fresamento frontal de ferro fundido cinzento GG25 com ferramentas de cerâmica


O objetivo desta pesquisa é analisar a influência dos parâmetros de corte no fresamento frontal de componentes de ferro fundido cinzento GG25 empregando ferramentas de nitreto de silício (Si3N4). Por se tratar de uma aplicação industrial, os requisitos de projeto dos componentes foram utilizados como critérios de fim de vida para os ensaios, especificamente a rugosidade da superfície, o erro de planicidade, o erro dimensional e o erro de perpendicularidade. Ao final da vida, as ferramentas foram avaliadas quanto à forma e aos mecanismos de desgaste. A combinação dos parâmetros de corte que apresentou a melhor relação entre custo e tempo de fabricação foi atingida com os parâmetros de vc = 1.500 m/min e fz = 0,2 mm/aresta.


F. G. Ebersbach e R. B. Schroeter

Data: 03/07/2017

Edição: MM Maio 2017 - Ano 53 - No 616

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Devido ás suas propriedades térmicas e mecânicas, os ferros fundidos são amplamente aplicados na indústria metalmecânica e tem importância fundamental para a indústria automotiva. Os ferros fundidos cinzentos, especificamente, apresentam características como baixo custo de fabricação e boa usinabilidade devido, principalmente, à grande quantidade de grafita livre em sua microestrutura, boa absorção de vibrações e boa estabilidade dimensional.Graças a elas, tem larga aplicação nas indústrias de máquinas e equipamentos, automobilística, ferroviária e naval[7,16,17].

König e Klocke[5] e Machado et al[6] comentam que o ferro fundido cinzento apresenta boas características para a usinagem, como baixa força de corte e produção de cavacos segmentados e arrancados, em decorrência da baixa dureza do material, relativa ductilidade e grande quantidade de grafite em pó. Resultados obtidos por Reuter et al[13] mostram que a vida da ferramenta aplicada no fresamento do ferro fundido cinzento chega a ser 50% maior do que a ferramenta aplicada na usinagem do ferro fundido vermicular.

O presente artigo tem como objetivo verificar a influência dos parâmetros de corte em uma operação de acabamento do fresamento frontal de blocos de ferro fundido cinzento GG25 aplicados em compressores her méticos, utilizando ferramentas de nitreto de silício. O desgaste de flanco e os mecanismos de desgaste foram avaliados nas ferramentas para as diferentes combinações dos parâmetros de corte.

O comportamento dos erros geométricos envolvidos nos blocos foi avaliado com o aumento do tempo principal de usinagem, assim como a infl uência dos parâmetros variados. Por fim, com os dados do tempo de vida obtidos para cada ensaio, foi possível verificar o comportamento do tempo e do custo de fabricação por peça.

Materiais e métodos

Neste estudo, foi utilizado o processo de fresamento frontal, com sentido de corte combinado (concordante e discordante).Os ensaios de fresamento foram realizados em um centro de usinagem horizontal de 4 eixos, modelo MCi 16 fabricado pela empresa Heller. A potência de acionamento do eixo-árvore foi de 30 kW, gerando um torque máximo de 143 Nm. O centro de usinagem apresenta avanço rápido de 60 m/min, bem como aceleração e desaceleração de 10 m/s2 nos eixos X, Y e Z. O comando numérico da máquina-ferramenta é o GE Fanuc 160 i MB, e o curso máximo nos eixos X, Y e Z é de 630 mm.

Material ensaiado, corpos de prova e grandezas

O material utilizado nos ensaios foi o fer ro fundido cinzento GG25. Segundo a Norma DIN 1691, este material apresenta uma resistência à tração mínima de 250 MPa e uma resistência à compressão de 690 a 980 MPa. Foi realizado um ensaio de dureza Brinell nos corpos de prova, que resultou em uma média de 195 HB para seis medições.

Os corpos de prova utilizados foram blocos empregados em compressores herméticos, como mostra a figura 1a (pág.47). A operação de fresamento estudada é responsável por usinar a região A em duas etapas: desbaste e acabamento.Em cada uma foram adotadas diferentes ferramentas.

A fixação foi realizada em um dispositivo hidráulico posicionado em um palete na máquina-ferramenta. Para a usinagem da região A, o corpo de prova é encostado em quatro apoios, sendo que a pressão exercida para manter o corpo de prova fixado é aplicada por meio de três travas.

Os blocos dos compressores herméticos apresentam diversas tolerâncias geométricas para proporcionar um bom funcionamento. A figura 1b mostra os valores admissíveis dos erros geométricos da região A, com a rugosidade da superfície usinada (a4), planicidade (a2), perpendicularidade (a3) e um erro de dimensão (a1 ).Com a finalidade de verificar o comportamento da operação de fresamento, foram realizadas medições de desgaste das ferramentas de corte, verificado lascamentos e rebarbas nos componentes usinados, planicidade, dimensional e a rugosidade da superfície usinada (Ra, Rt e Rz), conforme especificado na figura 1b.

Figura 1 – Geometria do corpo de prova usinado (a) e valores admissíveis dos erros geométricos da região A (b)

A forma de desgaste avaliada nas pastilhas foi o desgaste de flanco (VB), bem como as causas e mecanismos de desgaste. Para isso foi utilizado um microscópio eletrônico de varredura (MEV) da empresa Jeol, modelo JSM-6390LV. Foram tiradas fotos no plano do flanco principal, com a mesma ampliação para manutenção da mesma escala. Uma foto da aresta nova foi tirada no plano do flanco principal, visando traçar o perfil desta e utilizá-lo como referência nas medições de desgaste das pastilhas empregadas nos ensaios.

A qualidade da superfície usinada foi quantificada com base nos parâmetros de rugosidade Ra (único parâmetro especificado no projeto do componente), Rt, e Rz, usando um cut-off de 2,5 mm (empregado pela empresa parceira). Para isso foi utilizado um rugosímetro com apalpador mecânico da marca SM-Metrology Systems modelo RTP 80. O raio da ponta do diamante utilizado no apalpador mecânico do rugosímetro foi de 2 μm, com um ângulo de cone de 90o.

Entende-se que, quanto maior a quantidade de medições de rugosidade realizada em uma superfície, maior é a confiabilidade dos resultados.No entanto, além de demandar um tempo elevado para realizar muitas medições em uma superfície, o rugosímetro utilizado é responsável por realizar diversas outras medições de rugosidade em outros componentes, o que impossibilitou realizar mais do que uma única medição na face usinada. Já os erros de planicidade, perpendicularidade e dimensionais (a1, a2, a3) foram analisados por uma máquina de medir por coordenadas (MMC) da marca Zeiss, modelo Contura G2.

Os dados obtidos de desgaste das pastilhas e os erros geométricos foram avaliados estatisticamente de acordo com Montgomery e Runger[8]. O tempo principal de usinagem e os tempos secundários de cada ensaio foram calculados por meio do comportamento dos servomotores da máquina-ferramenta, levando-se em conta tanto a aceleração como a desaceleração dos mesmos, com o auxílio da programação CNC.

Ferramenta, parâmetros de corte e planejamento experimental

As pastilhas utilizadas nos ensaios foram de cerâmica fabricadas pela empresa CeramTec, apresentando oito arestas em uma face, bem como um furo em seu centro. O chanfro das arestas tem largura de 0,1 mm e inclinação de 20o em relação à face. O raio de quina é igual em todas elas e tem valor de 1,6 mm. O ângulo de incidência da pastilha é de 11o e o suporte utilizado também é fabricado também pela CeramTec (código PFL-080-07OP0643RAM), com diâmetro de 80 mm e sete pastilhas fixadas por parafusos apertados manualmente.

O suporte apresenta um ângulo de inclinação axial de +5o e um ângulo de inclinação radial de -6o. A pastilha, quando fixada ao suporte, apresenta um ângulo de direção da aresta de 0o. A fixação do suporte foi realizada por meio de um parafuso em um cone SK 40 para ferramentas de corte de facear.

Um plano de inspeção foi estabelecido para os corpos de prova, com o intuito de verificar o comportamento dos erros geométricos com o aumento do tempo principal de usinagem para cada ensaio realizado.Esse plano envolveu a análise de um corpo de prova usinado a cada 96 prontos (contagem realizada pela máquina-ferramenta). Essa análise engloba a medição rugosidade da superfície usinada (a4), planicidade (a2), perpendicularidade (a3) e um erro de dimensão (a1) para a operação de fresamento.

Com relação às pastilhas das ferramentas de corte, estas foram analisadas pelo MEV após a finalização de cada ensaio.Durante a execução dos mesmos, entretanto, era realizada uma inspeção visual a olho nu para verificar possíveis lascamentos que também foram utilizados como critério de fim de vida. Além da avaliação dos erros geométricos, cada corpo de prova usinado foi avaliado visualmente para identificar possíveis lascamentos e rebarbas, já que o componente não pode apresentar esses problemas, visto não existir uma etapa de manufatura subsequente à usinagem.

A sequência da realização dos ensaios envolve receber os corpos de prova brutos e, em seguida, ocorre a programação da máquina-ferramenta com a combinação dos parâmetros de corte estabelecidos e a fixação das ferramentas, bem como dos corpos de prova. Após a usinagem dos corpos de prova, o plano de inspeção estabelecido começa a ser executado.

Se o corpo de prova analisado apresentasse os erros geométricos dentro das tolerâncias especificadas, não tivesse rebarbas ou lascamentos, bem como as pastilhas utilizadas não mostrassem lascamentos visíveis a olho nu, o ensaio continuaria até que algum desses critérios saísse do especificado. Se algum desses critérios ultrapassasse os desvios estabelecidos no plano de inspeção, o ensaio seria finalizado para dar início a um novo.

No início de cada ensaio foram realizadas medições dos er ros geométricos no primeiro corpo de prova usinado e foi dada sequência ao plano de inspeção. Os ensaios realizados apresentaram um elevado tempo de duração para serem finalizados. Devido à questão do tempo, bem como da utilização de equipamentos, foi possível realizar somente uma réplica de cada ensaio.

Os ensaios foram executados sem o emprego de meios lubrificantes/refrigerantes e variando-se a velocidade de corte e o avanço por aresta. A tabela 1 mostra os parâmetros de corte utilizados nos ensaios de acabamento. A profundidade de corte axial para o acabamento foi de 0,6 mm.

Os parâmetros de cor te utilizados nos ensaios foram selecionados de acordo com as recomendações da empresa CeramTec. Nos ensaios, a escolha da velocidade de corte e do avanço por aresta foi feita em função do parâmetro de rugosidade Ra , como especificado na figura 1b, de acordo com o fabricante da fer ramenta de corte.

Resultados obtidos

No presente capítulo são apresentados os resultados obtidos dos ensaios. Eles estão divididos em três etapas: a primeira com os resultados obtidos de desgaste das ferramentas de corte; a segunda com os resultados obtidos dos erros geométricos dos corpos de prova para cada ensaio realizado e a terceira etapa com as considerações econômicas do processo.

Análise de desgaste das ferramentas

Na tabela 2 (pág. 51) são mostrados os resultados obtidos do tempo principal total de usinagem, comprimento total usinado e o número total de peças usinadas no final de cada ensaio. Verifica-se que, com o aumento dos parâmetros de corte para o acabamento, foi reduzida a quantidade de corpos de prova usinados em cada ensaio.

Segundo König e Klocke[5] e Machado et al[5], o parâmetro de corte que apresenta maior influência sobre a vida de uma ferramenta é a velocidade de corte, por ser o principal responsável pelo aumento da temperatura na região de formação de cavacos. Porém, a força de usinagem aumenta com o incremento do avanço. Consequentemente, o aumento das componentes da força de usinagem leva a menores vidas das ferramentas, influenciando também na temperatura na região do corte, entretanto, com menor significância do que a velocidade de corte[4,5,6].

As pastilhas de todos os ensaios apresentaram desgaste localizado predominantemente no raio de quina. Devido à cinemática do processo de fresamento, a ferramenta de corte percorre uma distância linear sobre a peça usinada por meio do avanço por rotação, que é definido pela quantidade de pastilhas presentes na ferramenta, juntamente com o avanço por aresta (fz).

Como o sobremetal deixado para a etapa de acabamento é uniforme em toda a superfície a ser usinada, e utilizando os princípios da cinemática do processo, a região do raio de quina das pastilhas é a que sofre as maiores solicitações provenientes do processo de usinagem, por ser a principal responsável pela remoção do material. Os ensaios 2.1 e 2.2 foram os únicos finalizados devido aos lascamentos presentes tanto na face, como no flanco de algumas pastilhas, e não foram usados para mensurar o desgaste de flanco médio.

No gráfico apresentado na figura 2 (pág. 52) são mostrados os valores médios obtidos do desgaste de flanco dos ensaios, com os seus respectivos intervalos de confiança. Verificando-se os valores do desgaste de flanco dos ensaios, nota-se que o aumento dos parâmetros de corte do ensaio 2.1 para os ensaios 2.2 e 2.4 provocou aumento no desgaste das pastilhas. No entanto, mesmo com parâmetros de corte mais elevados que nos dois primeiros ensaios, as ferramentas do ensaio 2.3 foram as que apresentaram menor desgaste, apresentando uma redução quando comparado com os ensaios 2.1, 2.2 e 2.4 de aproximadamente 10%, 15% e 25%.

Figura 2 – Resultados do desgaste de flanco médio dos ensaios de acabamento da região A

Para melhor compreensão do comportamento do processo e visando identificar os efeitos dos mecanismos de desgaste das pastilhas utilizadas nos ensaios, foi utilizado o MEV. A figura 3a (pág. 52) mostra a aresta de uma pastilha utilizada no ensaio 2.2, na qual verifica-se lascamento.Assim como algumas pastilhas utilizadas nos ensaios de desbaste da região A, os ensaios de acabamento 2.1 e 2.2, apresentaram alguns lascamentos que, segundo Diniz et al[4], König e Klocke[5] e Trent e Wright[16], são ocasionados por solicitações mecânica excessivas, ocorrendo principalmente em materiais frágeis. Como houve lascamentos das pastilhas nos ensaios 2.1 e 2.2, é possível que, para esses ensaios, as solicitações mecânicas tenham sido muito mais pronunciadas que as térmicas durante a usinagem.

A figura 3b mostra a aresta de uma das pastilhas utilizadas no ensaio 2.3. Verificam-se partículas de material aderidas à aresta da pastilha, caracterizando desgaste por adesão. Esses caldeamentos, segundo König e Klocke[5] e Trent e Wright[16], são decorrência da ação de forças elevadas durante o processo de usinagem ou pela interação entre a superfície dos cavacos e a face da ferramenta de corte. As marcas encontradas caracterizam o desgaste abrasivo, promovido por partículas duras presentes no material usinado ou soltas entre a superfície a ser usinada e a ferramenta de corte, e que deslizam sobre uma superfície de menor dureza. Estas são formadas no sentido de movimento do corte devido ao atrito entre a ferramenta, a superfície da peça e o cavaco.

Figura 3 – Pastilha no final da vida, utilizada no ensaio 2.2 (a), caracterização da pastilha utilizada no ensaio 2.3 (b) e espectro EDS no ponto 1 (c)

Uma camada aderida à face foi encontrada somente nas pastilhas utilizadas no ensaio 2.3. Segundo Abele et al[1] e Poulachon et al[12], na interface cavaco-ferramenta ocorre a formação de uma película protetora quimicamente estável na superfície da ferramenta de corte denominada de built-up layer, que protege a ferramenta contra o desgaste e reduz o atrito na interface cavaco-ferramenta, na usinagem do ferro fundido cinzento e de aços de corte fácil.

A aderência de uma camada protetora sobre a superfície da ferramenta depende, principalmente, de acordo com Araki e Yamamoto[2] e Tieu et al[15], da afinidade química e principalmente da energia de interface entre ferramenta e cavaco.Portanto, a afinidade química entre o material da ferramenta e o ferro fundido cinzento, bem como as condições ideais de força e temperatura proporcionadas pelos parâmetros de corte utilizados no ensaio 2.3, provavelmente levou à formação da camada aderida presente nas pastilhas. Com isto, é possível que o menor desgaste de flanco apresentado na figura 2 tenha ocorrido em função da adesão desta camada sobre a face da ferramenta.

No ensaio 2.4, porém, no qual foram empregados parâmetros de corte mais elevados que no ensaio 2.3, não foram verifi cados lascamentos ou uma camada aderida sobre as pastilhas. A temperatura na região na qual ocorre a formação do cavaco durante um processo de usinagem é influenciada principalmente pela velocidade de corte, de acordo com König e Klocke[5] e Machado et al[6].

O aumento da temperatura durante a usinagem é promovido principalmente pelo aumento da velocidade de corte, que modifica consideravelmente a energia de interface entre cavaco e ferramenta.De acordo com Araki e Yamamoto[2] e Tieu et al[15], este fator é de importância fundamental na formação de uma camada protetora.

Segundo Nordgren e Melander[9], o desaparecimento de uma camada de sulfeto de manganês (MnS) da face da ferramenta ocorre em velocidades de corte altas, pois o aumento da temperatura durante o processo de usinagem reduz sua resistência. Com base nisto, sugere-se que não houve a adesão de uma camada protetora sobre as pastilhas do ensaio 2.4 como a que ocorreu no ensaio 2.3, devido ao aumento da temperatura de corte durante a usinagem (ocasionado principalmente pelo aumento da velocidade de corte).

Tampouco foram verificados lascamentos nas pastilhas, pois as solicitações térmicas foram mais severas do que as solicitações mecânicas. Foi também realizada uma análise de composição química local por EDS no microscópio eletrônico de varredura com o intuito de identificar os elementos encontrados na camada aderida. Na fi gura 3b é apresentado o ponto avaliado na face da pastilha por meio do espectro EDS.

A análise do espectro da figura 3c mostra os elementos químicos encontrados no ponto 1, no qual verifica-se a presença de alumínio (Al), ferro (Fe), carbono (C), manganês (Mn) e enxofre (S), sendo os elementos presentes na camada aderida sobre a pastilha. Em seu estudo no torneamento do ferro fundido cinzento FC 250 com ferramentas de nitreto de silício, Pereira[11] encontrou, para determinados parâmetros de corte, um alto teor de enxofre e manganês sobre a aresta, sendo que o autor comenta tratar-se de uma forte indicação de que as inclusões de sulfeto de manganês aderiram à ferramenta.

O alumínio também foi encontrado pelo autor sobre a ferramenta de corte e este considera tal fato de grande importância na manutenção dessas inclusões sobre a aresta.Portanto, há uma forte indicação da ocorrência de adesão de sulfetos de manganês sobre a aresta das pastilhas do ensaio 2.3 que, segundo Abele et al[1], reduzem o atrito na interface cavaco-ferramenta e o desgaste abrasivo sobre a ferramenta de corte.

Erros geométricos

Neste tópico são apresentados os resultados obtidos do erro dimensional (a1), erro de planicidade (a2), erro de perpendicularidade (a3) e rugosidade da superfície usinada (a4).

ERRO DIMENSIONAL a1

O valor do erro dimensional (a1) aceitável é de 57,37 a 57,47 mm. Com a máquina de medir por coordenadas foram analisados os corpos de prova adotando como “zero” a medida média de 57,42 mm, apresentando como limite superior 0,05 mm, que representa o valor de 57,47 mm. Como limite inferior foi adotado -0,05 mm, o que representa o valor de 57,37 mm. O comportamento do erro dimensional (a1), para os quatros ensaios de acabamento, apresentou-se uniforme com o aumento do tempo principal de usinagem, não sofrendo modifi cações com a evolução do desgaste das pastilhas.

A figura 4 apresenta o boxplot dos resultados obtidos do erro.Para os ensaios 2.1, 2.2, 2.3 e 2.4, o erro dimensional variou de 0,043 a -0,012 mm, 0,037 a -0,031 mm, 0,039 a -0,042 mm e 0,027 a -0,031 mm, respectivamente. Como a tolerância admitida é de 0,05 a -0,05 mm, nenhum dos ensaios foi finalizado pelo erro dimensional estar fora do especificado em projeto para os corpos de prova.

Figura 4 – Boxplot dos dados obtidos do erro dimensional a1

Aplicando o teste de hipóteses, conforme Montgomery e Runger[8], nos resultados obtidos em todos os ensaios, verifica-se que a média dos dados apresenta diferenças entre si.O ensaio 2.1 apresenta diferenças das médias dos ensaios 2.2, 2.3 e 2.4. Em relação aos dados do ensaio 2.2, ocorrem diferenças das médias dos ensaios 2.1 e 2.4. Entretanto, o ensaio 2.3 apresenta somente diferença da média do ensaio 2.4, e o ensaio 2.4 apresenta diferença das médias dos dados obtidos dos ensaios 2.1 e 2.2.

Utilizando como base o teste de hipóteses e o boxplot da figura 4, verifica-se uma tendência do erro dimensional a 1 de se aproximar do seu valor mínimo (57,37 mm) com o aumento dos parâmetros de corte – principalmente pela diferença entre as médias do ensaio 2.1 e 2.4. O aumento do avanço por aresta acarreta um aumento também das componentes da força de usinagem, fazendo com que a ferramenta de corte se afaste da superfície usinada devido principalmente à força passiva.

Entretanto, nos ensaios realizados, além de elevar o avanço por aresta, a velocidade de corte também sofreu aumento. Diferentemente do avanço, o aumento da velocidade de corte tende a reduzir as componentes da força de usinagem, o que, segundo König e Klocke[5] e Machado et al[6], é ocasionado por apresentar influência direta na temperatura na região do corte, diminuindo assim a resistência mecânica do material a ser usinado.

Com base na análise do desgaste das pastilhas (vide item 3.1) e no teste de hipóteses das médias obtidas do erro dimensional (a1), o aumento dos parâmetros de corte utilizados nos ensaios acarretou uma diminuição do erro dimensional. Isso ocorreu devido ao fato de as solicitações térmicas serem provavelmente mais pronunciadas que as solicitações mecânicas, o que gerou o aumento dos parâmetros de corte.

ERRO DE PLANICIDADE a2

Para os ensaios 2.1 e 2.2, os valores do erro de planicidade apresentaram um comportamento uniforme com a evolução do desgaste das pastilhas.No entanto, para os ensaios 2.3 e 2.4, o erro de planicidade aumentou ao final destes. Ele foi o critério utilizado para finalizar os ensaios 2.3 e 2.4, pois estes apresentaram, a partir de um determinado tempo de usinagem, um valor acima de 0,02 mm, conforme mostra a figura 5.

Figura 5 – Boxplot dos dados obtidos do erro de planicidade a2

Em operações de faceamento no fresamento, segundo Tai et al[14], o erro de planicidade é causado pela deformação gerada no momento do aperto da peça, pelas tensões residuais e deflexões causadas pelas forças e pela expansão térmica durante o processo. Como visto nos resultados de desgaste para os ensaios de acabamento (vide item 3.1), os dois primeiros (ensaio 2.1 e 2.2) apresentaram lascamentos nas pastilhas. Segundo Diniz et al[4], König e Klocke[5] e Trent e Wright[16], estes são originados devido a esforços elevados durante a usinagem, principalmente em ferramentas de material frágil.

Entretanto, nos ensaios 2.3 e 2.4 não ocorreram lascamentos nas pastilhas, sugerindo que tal acontecimento seja em função das solicitações térmicas mais pronunciadas do que das solicitações mecânicas durante a usinagem. Portanto, em consequência disso, nos ensaios 2.3 e 2.4 ocorreu uma expansão térmica maior nas superfícies usinadas que, combinadas com os esforços durante o processo, acarretou em um aumento do erro de planicidade.

Aplicando o teste de hipóteses, conforme Montgomery e Runger[8], nos resultados obtidos em todos os ensaios, verifica-se que a média dos dados apresenta diferenças significativas. O ensaio 2.1 apresenta diferenças das médias dos ensaios 2.3 e 2.4. Em relação aos dados do ensaio 2.2, ocorrem diferenças das médias dos ensaios 2.3 e 2.4.Entretanto, o ensaio 2.3 apresenta diferenças das médias em relação a 2.1, 2.2 e 2.4, e o último apresenta diferenças das médias dos dados obtidos dos ensaios 2.1, 2.2 e 2.3.

Na figura 5 é mostrado o boxplot dos dados obtidos do erro de planicidade para os ensaios realizados. Analisando esses resultados, é possível observar que os ensaios geraram valores que variam na faixa de 0,005 a 0,025 mm. Verificando o comportamento das médias, nota-se uma semelhança no comportamento com os resultados obtidos do desgaste de flanco médio das pastilhas apresentadas na figura 2 para os quatro ensaios.

À medida que a ferramenta de corte vai se desgastando, a temperatura aumenta progressivamente, a força de corte e a potência consumida aumentam, as dimensões da peça se alteram e o acabamento da superfície piora[5,16] . Portanto, quanto maior o desgaste da ferramenta de corte, maiores serão os esforços e temperatura durante a usinagem que, segundo Tai et al[14], influenciam consideravelmente na planicidade da superfície fresada.

ERRO DE PERPENDICULARIDADE a3

O erro de perpendicularidade não ultrapassou o limite especificado para os ensaios realizados, apresentando um comportamento uniforme com o aumento do tempo principal de usinagem, assim como não sofreu influência com a evolução do desgaste das pastilhas. Porém, ocorreu uma grande amplitude dos valores do erro em todos os ensaios realizados, bem como uma grande dispersão dos resultados, não sendo verificadas diferenças significativas entre as médias dos dados de cada ensaio, por meio do teste de hipóteses.

Com isso, não foi possível verificar a tendência do comportamento do erro de perpendicularidade com a combinação dos parâmetros de corte envolvidos.Sugere-se que a dispersão dos resultados obtidos do erro de perpendicularidade pode ser influenciada pela variação dimensional que se pode ter nos corpos de prova fundidos, pois, na fixação, os mesmos podem apresentar deslocamentos devido a solicitações alternantes do processo de fresamento ou erros geométricos associados ao furo de referência E, utilizado para medir a perpendicularidade da face fresada.

RUGOSIDADE DA SUPERFÍCIE USINADA a4

Figura 6 – Valores dos parâmetros Ra, Rz e Rt com o aumento do tempo principal de usinagem

A medição de rugosidade da superfície usinada, feita no mesmo sentido de avanço da ferramenta de corte sobre a superfície, foi realizada em um único ponto. A figura 6 (pág. 57) ilustra os resultados de rugosidade obtidos (parâmetro Ra, Rz e Rt) no início, meio e fim dos quatro ensaios realizados.

Analisando-se os resultados obtidos, é possível observar que os ensaios realizados apresentaram o valor do parâmetro Ra entre 1,6 a 6,3 μm (especificado em projeto para os corpos de prova). Consequentemente, nenhum ensaio foi finalizado devido à rugosidade da superfície. Os resultados variaram entre 1,7 a 4,5 μm; 9,2 a 21,2 μm e 10,9 a 22,2 μm para os parâmetros Ra, Rz e Rt, respectivamente.

Cada ensaio realizado apresentou diferentes valores dos parâmetros de rugosidade no primeiro corpo de prova usinado, devido à combinação dos parâmetros de corte, o que influencia na temperatura e nas forças durante o processo de usinagem. Conforme ocorreu o aumento do tempo principal de usinagem, a qualidade da superfície usinada foi sendo deteriorada em todos os ensaios.

O desgaste na ferramenta ocorre normalmente de forma gradativa e, à medida que a ferramenta vai desgastando, o acabamento da superfície piora[5,16]. Segundo Oliveira et al[10], a evolução do desgaste modifica a topografia da aresta, que é transferida para a superfície que está sendo usinada.

Considerações econômicas

onsiderações econômicas O critério de fim de vida dos ensaios de acabamento empregados para a região A foi, para alguns ensaios, o lascamento das pastilhas e, para outros, o erro de planicidade fora da especificação. No entanto, por se tratar de uma linha de produção de uma indústria, a maior dificuldade encontrada para a realização dos ensaios foi a questão do tempo.

Em consequência disso, foi adotada a combinação dos parâmetros de corte (velocidade de corte e avanço por aresta) indicados pela fabricante das pastilhas para a realização dos ensaios, levando-se em conta primeiramente a rugosidade da superfície, conforme a especificação no projeto. Diante disso, não foi possível encontrar a equação de Taylor para a vida da ferramenta, sendo somente calculado o tempo de vida da ferramenta com os ensaios realizados, bem como o comportamento do custo e do tempo de fabricação por peça.

O gráfico apresentado na figura 7 (pág. 59) apresenta o tempo de vida da ferramenta para cada ensaio realizado. Verifica-se que, conforme ocorre o aumento dos parâmetros de corte (velocidade de corte e avanço por aresta), o tempo de vida da ferramenta diminui, sendo possível ser representado por uma reta.

Figura 7 – Vida da ferramenta para os ensaios de acabamento da região A

Comparando-se os parâmetros de corte empregados pela empresa parceira (ensaio 2.1), a redução do tempo de vida da ferramenta chega a ser de 30%, 65% e 90% com o aumento dos parâmetros de corte (ensaios 2.2, 2.3 e 2.4, respectivamente).Como a vida da ferramenta decai linearmente em uma escala não logarítmica, a equação de Taylor não pode ser empregada para os ensaios de acabamento da região A. Isso ocorreu porque não houve a combinação de todas as velocidades de corte com todos os avanços por aresta ensaiados.

O comportamento do custo e do tempo de fabricação por peça para os ensaios de acabamento pode ser visto na figura 8 (pág.60). Nota-se que o aumento dos parâmetros de corte (velocidade de corte e avanço por aresta) apresenta uma tendência de acarretar uma redução no custo e no tempo de fabricação por peça.

Figura 8 – Comportamento do custo de fabricação por peça (a) e tempo de fabricação por peça (b) para os ensaios de acabamento da região A

Sugere-se que a grande dispersão dos dados com a curva de tendência apresentada nos gráficos da fi gura 8 esteja relacionada à combinação dos parâmetros de corte, já que não foi possível interligar as velocidades de corte com todos os avanços por aresta.

Conclusão

No presente trabalho foi estudada a operação de acabamento do fresamento frontal de uma região de blocos de compressores herméticos, com o objetivo de analisar a influência dos parâmetros de corte empregando ferramentas de nitreto de silício (Si3N4).

A análise no MEV mostrou que o mecanismo de degaste predominante nas pastilhas de cerâmica foi a abrasão. Em decorrência da baixa tenacidade e resistência à flexão, foram apresentados lascamentos para determinados parâmetros de corte. A combinação dos parâmetros de corte (velocidade de corte e avanço por aresta) em alguns ensaios acarretou uma camada aderida, que pode ter atuado como lubrificante e, ao mesmo tempo, ter protegido as pastilhas dos mecanismos de desgaste.

Com relação aos erros geométricos, a variação dos parâmetros de corte apresentou influência nos erros dimensional e na planicidade, bem como na qualidade da superfície usinada.

Em relação às considerações econômicas, verificou-se que o aumento da velocidade de corte combinado com o avanço por aresta proporcionou redução do custo e do tempo de fabricação por peça. Os parâmetros de corte máximos ensaiados (velocidade de corte de 1.500 m/ min e avanço de 0,2 mm/aresta) foram os que apresentaram menor custo e tempo de fabricação por peça, acar retando uma redução considerável quando comparados aos empregados atualmente no processo.

Referências

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